Revista Agrária Acadêmica
doi: 10.32406/v5n4/2022/1-10/agrariacad
Digestibilidade aparente dos nutrientes e balanço de nitrogênio de cordeiros terminados em confinamento alimentados com resíduo úmido de cervejaria como fonte de volumoso. Apparent digestibility of nutrients and nitrogen balance of lambs finished in feedlot with wet brewery grains as volume source.
William Soares Teixeira1*, Sérgio Carvalho
2, Veronica Gindri Manzoni
1, Robson Rodrigues Simões1, Andressa Ana Martins3, Juliano Henriques da Motta
4, Diulia Zolin Galvani
1, Juliene da Silva Rosa
1
1- Pós-Graduação em Zootecnia – Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Santa Maria – RS. E-mail: williamteixeira.wst@gmail.com, vemanzoni@hotmail.com, robsonrsimoes@hotmail.com, diulia.zootecnia@gmail.com, juliener22@gmail.com
2- Docente do Departamento de Zootecnia – Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Santa Maria – RS. E-mail: scarvalhoufsm@hotmail.com
3- Docente – Faculdade Santo Ângelo – FASA, Santo Ângelo – RS. E-mail: dess.a@hotmail.com
4- Pós-Graduação em Zootecnia – Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre – RS. E-mail: julianomotta-06@hotmail.com
*Autor correspondente
Resumo
O objetivo deste experimento foi avaliar o efeito de níveis de resíduo úmido de cervejaria (RUC) como fonte de volumoso sobre a digestibilidade aparente dos nutrientes e balanço de nitrogênio de cordeiros em confinamento. Os tratamentos foram constituídos por quatro níveis de RUC como alimento volumoso, sendo: 31; 44; 57 e 70 %, em base da matéria seca. O aumento do nível de RUC como alimento volumoso da dieta leva a diminuição linear (P≤0,01) dos coeficientes de digestibilidade da matéria seca e da matéria orgânica. O consumo de N reduziu linearmente (P≤0,05) com a elevação do nível de RUC na dieta.
Palavras-chave: Consumo. Fibra em detergente neutro. Proteína bruta.
Abstract
The objective of this experiment was to evaluate the effect of wet brewery residue (RUC) levels as a forage source on the apparent digestibility of nutrients and nitrogen balance of feedlot lambs. The treatments consisted of four levels of RUC as forage, as follows: 31; 44; 57 and 70 % on a dry matter basis. The increase in the level of RUC as a roughage in the diet leads to a linear decrease (P≤0.01) of the digestibility coefficients of dry matter and organic matter. N intake decreased linearly (P≤0.05) with increasing dietary RUC level.
Keywords: Intake. Neutral detergent fiber. Crude protein.
Introdução
Ao longo do tempo, os ruminantes desenvolveram uma alta capacidade de ingestão de alimento, juntamente com uma relação mutualística com os diferentes microrganismos responsáveis pela sua digestão (WLODARSKI et al., 2017). Segundo Carvalho et al. (2015) na terminação de cordeiros em confinamento, torna – se cada vez mais importante a busca por alimento de qualidade para que a resposta animal seja satisfatória, uma vez que a alimentação é um dos custos mais onerosos dentro desse sistema de produção. Para Geron et al. (2013) uma alternativa para alimentação de animais ruminantes são os subprodutos das indústrias. Neste contexto se torna necessário que seja conhecida e apurada a digestibilidade do alimento que se quer usar, para melhor adequação das dietas e conforme Canesin et al. (2012) é a sua capacidade de sustentar diferentes tipos e níveis de desempenho animal.
Para Frasson et al. (2018), dentre os vários subprodutos oriundos do beneficiamento da indústria, destaca-se o resíduo úmido de cervejaria. Devido ao alto teor de fibra em detergente neutro e de água, com baixo teor de matéria seca, o resíduo úmido de cervejaria é bastante utilizado como fonte de alimento volumoso, contendo bons níveis proteicos em sua composição.
Segundo Silva et al. (2014), conhecer os valores nutricionais do RUC possibilita a sua utilização na dieta de animais de forma mais eficiente, para que possam ser utilizados como fontes estratégicas de alimentos em período crítico de escassez de volumoso, ou em substituição a alimentos tradicionais que são mais caros. Faccenda et al. (2017) avaliando a ingestão e a digestibilidade dos nutrientes, da silagem de resíduo de cervejaria em substituição ao farelo de soja para bovinos, observaram um aumento na ingestão de extrato etéreo, fibra em detergente neutro e ácidos porém a digestibilidade de matéria seca reduziu com o aumento da substituição do farelo de soja.
Segundo Simionatto e Maeda (2017), relatam a importância da avaliação do balanço de nitrogênio, pois assim se consegue predizer a quantidade de proteína adequada para que se forneçam aminoácidos suficientes para atender as exigências de mantença e produção, sem maiores desperdícios para o animal. Santos et al. (2014) comentam uma das vantagens do RUC, onde no processamento do malte para a produção da cerveja, faz com que a fração proteica do RUC se torne predominantemente composta por proteínas insolúveis e de baixa degradabilidade ruminal. Formando assim, uma proteína de origem vegetal que, naturalmente protegida da degradação ruminal, é digerida no abomaso ou no intestino, tendo assim um aproveitamento de proteínas de melhor qualidade.
Assim, este trabalho teve como objetivo avaliar o efeito de níveis crescentes de resíduo úmido de cervejaria como fonte de volumoso da dieta sobre a digestibilidade aparente dos nutrientes e sobre o balanço de nitrogênio de cordeiros terminados em confinamento.
Materiais e métodos
O experimento foi conduzido no Laboratório de Bromatologia e Nutrição de Ruminantes, vinculado ao Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS, no período entre março de 2016 e janeiro de 2018. Este experimento foi realizado de acordo com as normas aprovado pelo Comitê de Ética em Experimentação Animal da mesma instituição (protocolo nº 9138100516).
Foram utilizados 8 cordeiros machos, não castrados, provenientes de um cruzamento alternado contínuo entre as raças Texel e Ile de France, desmamados aos 50 dias de idade, mantidos em gaiolas metabólicas providas de comedouros, para controle do consumo de alimento, e de bebedouros.
Os animais foram distribuídos em delineamento experimental quadrado latino 4×4 duplo (quatro níveis de resíduo úmido de cervejaria como fonte de volumoso x quatro períodos de coleta de amostras). O ensaio foi conduzido em quatro períodos de 21 dias, sendo 14 dias de adaptação ao manejo e ao alimento e 7 dias de coleta de dados e de amostras. Os tratamentos foram constituídos por quatro níveis de resíduo úmido de cervejaria como volumoso (% da MS), sendo: 31; 44; 57 e 70 %.
A dieta total foi fornecida ad libitum, composta por volumoso a base de resíduo úmido de cervejaria e concentrado composto por milho desintegrado (Zea mays L.), farelo de soja (Glycine max L.), calcário calcítico e sal mineral. As dietas foram formuladas para serem isoproteicas, de acordo com o National Research Council (2007), sendo calculada para atender as exigências preconizadas para ganho de 0,200 kg diários. A relação entre volumoso e concentrado variou de acordo com o tratamento, em base da matéria seca (MS), de maneira a se atingir o nível de resíduo úmido de cervejaria pretendido para a dieta experimental.
Na Tabela 1 é apresentada a composição bromatológica dos alimentos utilizados na formulação das dietas, e na Tabela 2, a proporção dos ingredientes e a composição bromatológica das dietas experimentais. O alimento foi fornecido duas vezes ao dia, às 08:00 e as 17:00 horas. A quantidade ofertada aos animais alimentados foi ajustada para manter as sobras em 10 % do total oferecido, e assim garantiu uma alimentação ad libitum.
Tabela 1 – Teores médios de matéria seca (MS), matéria orgânica (MO), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE), fibra em detergente neutro (FDN), fibra em detergente ácido (FDA), carboidratos totais (CHT), nutrientes digestíveis totais (NDT), lignina (LDA), cinzas (CIN), cálcio (Ca) e fósforo (P), dos ingredientes utilizados na formulação das dietas experimentais
Item (%) |
Resíduo de cervejaria |
Milho quebrado |
Farelode soja |
Calcário calcítico |
Sal |
MS |
24,20 |
87,82 |
87,55 |
100 |
100 |
MO |
93,70 |
98,54 |
92,59 |
– |
– |
PB |
21,18 |
9,23 |
53,18 |
– |
– |
EE |
8,91 |
0,90 |
3,36 |
– |
– |
FDN |
63,71 |
10,37 |
12,94 |
– |
– |
FDA |
22,40 |
2,14 |
4,83 |
– |
– |
CHT |
63,61 |
88,41 |
36,05 |
– |
– |
NDT¹ |
66,12 |
87,24 |
81,50 |
– |
– |
LDA |
8,47 |
0,82 |
2,19 |
– |
– |
CIN |
6,30 |
1,46 |
7,41 |
100 |
100 |
Ca |
0,23 |
0,03 |
0,34 |
34 |
– |
P |
0,70 |
0,25 |
0,58 |
0,02 |
– |
1 Valor tabelado (Valadares Filho, Paulino & Magalhães, 2006)
Tabela 2 – Proporção dos ingredientes (% MS) e composição bromatológica das dietas experimentais
Teor de resíduo de cervejaria |
|||||||
31 % |
44 % |
57 % |
70 % |
||||
Proporção dos ingredientes (%MS) |
|||||||
Resíduo de cervejaria |
31,00 |
44,00 |
57,00 |
70,00 |
|||
Milho quebrado |
51,84 |
42,14 |
32,37 |
22,61 |
|||
Farelo de soja |
14,03 |
10,53 |
7,05 |
3,57 |
|||
Calcário calcítico |
2,13 |
2,33 |
2,58 |
2,82 |
|||
Sal |
1,00 |
1,00 |
1,00 |
1,00 |
|||
Composição bromatológica (% MS) |
|||||||
MS |
68,44 |
60,20 |
51,97 |
43,74 |
|||
MO |
93,12 |
92,50 |
91,83 |
91,18 |
|||
PB |
18,81 |
18,81 |
18,81 |
18,81 |
|||
EE |
3,70 |
4,65 |
5,61 |
6,56 |
|||
FDN |
26,94 |
33,76 |
40,58 |
47,40 |
|||
FDA |
8,73 |
11,27 |
13,80 |
16,34 |
|||
CHT |
70,61 |
69,04 |
67,42 |
65,81 |
|||
LDA |
3,36 |
4,30 |
5,25 |
6,19 |
|||
NDT |
77,16 |
74,44 |
71,68 |
68,92 |
|||
CIN |
6,88 |
7,50 |
8,17 |
8,82 |
|||
Ca |
0,86 |
0,94 |
1,04 |
1,14 |
|||
P |
0,43 |
0,47 |
0,52 |
0,57 |
As amostras dos alimentos e das sobras foram coletadas diariamente durante o 15º e o 21º dia do período experimental, após foi formada uma amostra composta destas coletas. Para se estimar os coeficientes de digestibilidade aparente dos nutrientes, bem como o balanço de nitrogênio, utilizou-se o método de coleta total de fezes e urina, entre o 15º e 21º dia, para cada repetição. As coletas foram efetuadas diariamente, pela tarde.
Para coleta de urina, foram colocados coletes coletores nos animais. A urina era coletada em frascos contendo 100 m L de uma solução de ácido sulfúrico a 20 % (v/v). Amostras de fezes (aproximadamente 10 % do total) e de urina (1 % do volume total) foram coletadas diariamente. As amostras de urina foram diluídas com água destilada para completar um volume de 50 m L e congeladas (-20 oC) para posteriores análises. As amostras diárias das fezes e da urina foram homogeneizadas por animal e por período, constituindo amostras compostas.
As amostras dos alimentos fornecidos, sobras e fezes foram pré-secadas em estufa de ventilação forçada a 55 °C por aproximadamente 72 horas sendo, em seguida, moídas em moinho tipo “Willey” com peneira de 1mm, para análises de FDN as amostras foram moídas em peneiras de 2 mm conforme Senger et al. (2008) e acondicionadas em frascos identificados.
Foram determinados, nas amostras de alimento e sobras, os teores de matéria seca (MS) por secagem em estufa a 105 °C durante pelo menos 16 horas. O conteúdo de cinzas (CIN) foi determinado por combustão a 600 °C durante 4 horas (SILVA; QUEIROZ, 2002). O teor de nitrogênio total (N) foi determinado pelo método Kjeldahl, modificado segundo Kozloski et. al (2003). A determinação dos teores de extrato etéreo (EE) foi realizada de acordo com Silva e Queiroz (2002). Para determinação da concentração de fibra em detergente neutro (FDN) as amostras foram acondicionadas em saquinhos de poliéster tratados com solução detergente neutro em autoclave a 110 °C por 40 minutos (SENGER et al., 2008). As concentrações de fibra em detergente ácido (FDA) e lignina (LDA) foram determinadas de acordo com a Association of Official Analytical Chemists – AOAC (Método 973.18, 1997). Os carboidratos totais (CHT) foram determinados segundo Sniffen et al. (1992), em que CHT (%) = 100 – (% PB + % EE + % CIN). Os valores correspondentes aos nutrientes digestíveis totais (NDT) foram obtidos de valores tabelados segundo Valadares Filho et al. (2006).
As amostras de urina foram descongeladas à temperatura ambiente, homogeneizadas, filtradas, em seguida, foram retiradas de cada amostra, duas sub-amostras, sobre as quais se determinou o conteúdo de nitrogênio total, conforme procedimento descrito por Silva e Queiroz (2002).
A digestibilidade aparente de cada um dos nutrientes matéria seca (MS), matéria orgânica (MO), proteína bruta (PB) e fibra em detergente neutro (FDN), foram calculadas a partir da seguinte fórmula:
DAN (%) = X 100
Em que:
DAN (%) = digestibilidade aparente do nutriente;
MSC = matéria seca consumida;
MSF = matéria seca fecal;
NMF = porcentagem do nutriente na matéria seca fecal;
NMS = porcentagem de cada nutriente na matéria seca consumida.
O delineamento experimental utilizado foi quadrado latino 4×4 duplo, onde após a coleta dos dados obtidos, os resultados foram submetidos à análise de variância e de regressão. As equações foram selecionadas com base nos coeficientes de determinação e na significância dos coeficientes de regressão, adotando-se um nível de 5 % de probabilidade, utilizando o teste t. Foram submetidos ao teste de normalidade de Shapiro-Wilk (P<0,05) e quando não normais, optou-se por excluir observações influentes (outliers). As análises estatísticas foram realizadas com o uso do software Sas Institute Inc (2016) versão 3.6.
Resultados e discussão
Os coeficientes de digestibilidade aparente da matéria seca e da matéria orgânica (Tabela 3) diminuíram linearmente (P≤0,01) à medida que se aumentou o nível de RUC como volumoso da dieta. Esse resultado pode ser atribuído à elevação da proporção de FDN, FDA e de LDA e, consequentemente, diminuição da proporção de carboidratos não fibrosos nas dietas (Tabela 2) à medida que se elevou o nível de RUC. Segundo Mizubuti et al. (2014), as frações de carboidratos do RUC apresentam uma alta representação pelas frações B2 e C dos carboidratos. Segundo Silva et al. (2014), a fração B2 é de degradação lenta e corresponde à parede celular disponível, que pode ser atribuído ao maior teor de FDN contida, e a fração C que corresponde a parede celular indisponível para os animais e para os microrganismos ruminais (lignina). Conforme Oliveira et al. (2011), a digestibilidade da fração fibrosa é menor em relação aos carboidratos não fibrosos, onde segundo Mizubuti et al. (2014), devido ao elevado teor de lignina encontrado no RUC, fração esta indigerível, corrobora o resultado obtido no presente estudo.
Silva et al. (2014) comparando a composição química e as frações dos carboidratos do RUC e o subproduto agroindustrial torta de amendoim, observaram que a fração C, que representa a parte indigestível do alimento dentro da MS, chegou a 38,4 % no RUC. No entanto a fração C da torta de amendoim ficou em 15,06 % somente. Esse fato explica a menor digestibilidade da MS do RUC o que consequentemente diminuiu a digestibilidade das dietas com maiores teores do resíduo. Esse aspecto pode explicar a maior digestibilidade da dieta experimental do presente estudo contendo maior proporção de concentrado (69 %) em comparação aquela com menor proporção de concentrado (30 %).
Souza et al. (2012) relatam coeficientes de digestibilidade in vitro da MS de 59,62 % do RUC, valores esses semelhantes aos observados no presente estudo ao maior nível de RUC na dieta (70 %) que foi 60,06 %. Estudando a qualidade fermentativa de silagens de resíduo úmido de cervejaria, Souza et al. (2015) observaram valores semelhantes aos obtidos neste estudo. Fato atribuído a menor digestibilidade do RUC comparada aos concentrados, que se deve aos menores teores de carboidratos não estruturais que os subprodutos apresentam e aos maiores valores de FDN e FDA.
Gilaverte et al. (2011) estudando parâmetros de digestibilidade e desempenho de ovinos Santa Inês, utilizando resíduo úmido de cervejaria em substituição ao milho, observaram redução da digestibilidade aparente dos nutrientes (P≤0,05) com a inclusão de RUC na dieta. Pois o subproduto na dieta reduziu severamente o consumo de MS, o que pode ser explicado pela alta umidade e limitação física de ingestão, resultado semelhante ao obtido no presente estudo para os consumos de MS e MO.
Os valores encontrados por Silva et al. (2014) que obtiveram coeficientes de digestibilidade in vitro da MS de 63,96 % e da MO de 62,04 %, valores menores do que os encontrados nesse trabalho, onde ao nível de 31 % de RUC foi de 69,25 % e a máxima digestibilidade da MO foi de 72,10 % também nesse nível de resíduo.
Os coeficientes de digestibilidade aparente da PB e da FDN não sofreram efeito significativo (P>0,05) pelo nível de utilização de RUC nas dietas. A não alteração do coeficiente de digestibilidade da proteína bruta ao passo que se eleva os níveis de RUC mostra a qualidade de aproveitamento desse nutriente no subproduto da indústria cervejeira, discordando de Gilaverte et al. (2011) que comenta que pode reduzir a digestibilidade desse nutriente em comparação ao milho e a polpa cítrica peletizada, pois, durante o processo de produção do resíduo úmido de cervejaria, a maior parte das proteínas solúveis, albuminas e globulinas, são removidas ou fermentadas o que pode reduzir esse coeficiente.
A não significância (P>0,05) do coeficiente de digestibilidade de FDN, discordam com os resultados obtidos por Santos et al. (2014) que observaram incremento do coeficiente de digestibilidade com efeito da adição do resíduo úmido de cervejaria sobre este parâmetro, em experimentos feitos com bubalinos suplementados com RUC em pastejo. Fatos que divergem de Gilaverte et al. (2011) que verificaram redução (P≤0,05) na digestibilidade de FDN de dietas contendo resíduo úmido de cervejaria.
Os resultados relativos ao efeito do nível de resíduo úmido de cervejaria como volumoso da dieta sobre o balanço de nitrogênio (N) no corpo dos cordeiros são apresentados na Tabela 4. Verifica-se que o consumo de N diminuiu linearmente (P<0,05) com a elevação do nível de RUC. Uma vez que as dietas foram formuladas para serem isoproteicas, contendo 18,81 % de PB, a redução do consumo de N se deve pela redução do consumo de MS observado como consequência do aumento do teor de FDN e de umidade com o incremento dos níveis de RUC.
Tabela 3 – Valores médios para os coeficientes de digestibilidade aparente da matéria seca (CDMS), matéria orgânica (CDMO), proteína bruta (CDPB) e fibra em detergente neutro (CDFDN), de acordo com os teores de resíduo úmido de cervejaria como fonte de volumoso
Teor de resíduo de cervejaria |
|||||||
31 % |
44 % |
57 % |
70 % |
Equação de regressão1 |
R2 |
P>F |
|
CDMS |
69,25 |
66,68 |
63,55 |
60,06 |
Ῡ=76,78391-0,23586RC |
0,52 |
<.0001 |
CDMO |
72,10 |
70,48 |
66,58 |
63,26 |
Ῡ=79,93327-0,23416RC |
0,50 |
<.0001 |
CDPB |
70,14 |
72,58 |
70,72 |
70,40 |
Ῡ=70,96 |
—– |
0,8725 |
CDFDN |
39,34 |
44,47 |
43,05 |
43,86 |
Ῡ=42,68 |
—– |
0,4501 |
1 RC = Teor de resíduo de cervejaria como alimento volumoso.
Com relação a excreção de nitrogênio fecal e total, observa-se que as mesmas não sofreram efeito (P>0,05) do aumento de RUC na dieta. Da mesma forma, à excreção de N urinário não foi influenciada pelo nível de RUC, o que concorda com a afirmativa de Peripolli et al. (2011), de que quando a ingestão de nitrogênio é adequada, boa proporção de N é reciclada no rúmen, via saliva ou através da parede ruminal, sendo que pequena quantidade é convertido em ureia e excretado via urina ou via fecal. Portanto, pode-se inferir que as dietas estavam adequadas as exigências dos animais, onde foram calculadas para serem isoproteicas.
Quanto ao nitrogênio retido no corpo dos cordeiros, também foi verificado redução linear (P≤0,05) em função da elevação da proporção de resíduo úmido de cervejaria como fonte de volumoso na dieta. Este fato, pode ser considerado um aspecto negativo, já que uma menor quantidade desse nutriente estará disponível para o metabolismo dos animais. Para Faleiro Neto et al. (2016), pode ocasionar a redução dos aspectos produtivos, principalmente relacionado ao crescimento muscular e ganho de peso dos animais. Esse resultado pode ser explicado pela afirmativa de Gilaverte et al. (2011), de que a digestibilidade da fração nitrogenada do resíduo úmido de cervejaria é inferior à do farelo de soja, de modo que a concentração de nitrogênio ligada à FDN (fração de lenta digestão) é maior no resíduo úmido de cervejaria. Assim, pode ser explicada a menor retenção de nitrogênio nas dietas experimentais contendo menor proporção de concentrado e maior de RUC, uma vez que nessas dietas a proporção de farelo de soja é menor devido ao elevado teor proteico presente no RUC.
Tabela 4 – Balanço de nitrogênio dos cordeiros, de acordo com os níveis de resíduo de cervejaria como fonte de volumoso. Valores médios para consumo de consumo de matéria seca (CMS, g dia –¹), consumo de nitrogênio (CN, g dia –¹), excreção de nitrogênio fecal (NFEC, g dia –¹), excreção de nitrogênio na urina (NUR, g dia –¹), nitrogênio excretado total (NEXT, g dia –¹), nitrogênio retido (NRET, g dia –¹) e nitrogênio retido em porcentagem do consumido (NRETP, %)
Teor de resíduo de cervejaria |
||||||||
31 % |
44 % |
57 % |
70 % |
Equação de regressão1 |
R2 |
Pr>F |
||
CMS |
865,19 |
884,92 |
786,83 |
714,60 |
Ῡ=1024,52385-4,18045RC |
0,15 |
0,0299 |
|
CN |
26,05 |
25,80 |
22,54 |
20,70 |
Ῡ=31,12621-0,14556RC |
0,23 |
0,0105 |
|
NFEC |
9,41 |
10,07 |
9,72 |
9,19 |
Ῡ=9,60 |
—– |
0,7031 |
|
NUR |
1,27 |
1,65 |
1,93 |
1,83 |
Ῡ=1,38 |
—– |
0,1894 |
|
NEXT |
10,68 |
11,73 |
11,65 |
11,02 |
Ῡ=11,27 |
—– |
0,3281 |
|
NRET(g) |
15,36 |
14,07 |
10,89 |
9,68 |
Ῡ=20,23223-0,13488RC |
0,27 |
0,0026 |
|
NRET(%) |
58,96 |
54,53 |
48,31 |
46,76 |
Ῡ=66,44766-0,28269RC |
0,70 |
<.0001 |
1 RC = Teor de resíduo de cervejaria como alimento volumoso.
Conclusão
O aumento do nível de resíduo úmido de cervejaria como fonte de alimento volumoso na dieta de cordeiros terminados em confinamento leva a diminuição da digestibilidade aparente da matéria seca e da matéria orgânica, bem como, a redução da quantidade de nitrogênio retida no corpo dos animais. Esses aspectos podem levar a limitação do desempenho produtivo.
Conflitos de interesse
Não houve conflito de interesses dos autores.
Contribuição dos autores
William Soares Teixeira – trabalho original da dissertação de mestrado, coleta de dados, análise de resultados e escrita; Veronica Gindri Mazoni, Robson Rodrigues Simões, Juliano Henriques da Motta, Diulia Zolin Galvani, Juliene da Silva Rosa – coleta de dados, análises laboratoriais, escrita e correções; Sérgio Carvalho, Andressa Ana Martins – orientação, correções e revisão do texto.
Referências bibliográficas
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Recebido em 9 de julho de 2022
Aceito sem ajustes em 23 de outubro de 2022