Revista Agrária Acadêmica
doi: 10.32406/v6n1/2023/40-56/agrariacad
Avanços na nutrição de bovinos leiteiros – uma revisão sobre os macrominerais. Advances in dairy cattle nutrition – a review on macrominerals.
Matheus Lehnhart de Moraes1, Franciely Alves Costa
2
1- Zootecnista – Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Campus Santa Maria – RS. E-mail: matheussps@hotmail.com
2- Médica Veterinária – Universidade Federal de Jataí – UFJ, Campus Jataí – GO.
Resumo
A nutrição mineral de bovinos leiteiros avançou consideravelmente nas últimas décadas. As exigências, assim como todo o metabolismo de cada elemento mineral vem sendo desmistificado pela ciência, atribuindo exatidão nas predições de exigências líquidas. Estes avanços também permitem entendermos os fatores que influenciam na absorção, metabolismo e seus impactos no organismo dos animais. Dentre os elementos minerais, os macroelementos representam o maior custo na formulações de suplementos e/ou núcleos minerais, e muitas vezes a suplementação excessiva destes pode causar sérios danos as vacas, além de contaminações ao meio ambiente. Neste contexto, esta revisão resume os principais avanços na nutrição dos macroelementos minerais para bovinos leiteiros, assim como suas exigências, principais fontes, funções, absorção, excesso e interações com outros elementos minerais.
Palavras-chave: Biodisponibilidade. Cálcio. Fósforo. Mineralização. Equações.
Abstract
Mineral nutrition for dairy cattle has advanced considerably in recent decades. The requirements, as well as the entire metabolism of each mineral element, have been demystified by science, attributing accuracy in the predictions of liquid requirements. These advances also allow us to understand the factors that influence absorption, metabolism and their impact on the animal’s organism. Among the mineral elements, the macroelements represent the highest cost in the formulation of supplements and/or mineral cores, and often the excessive supplementation of these can cause serious damage to the cows, in addition to contamination of the environment. In this context, this review summarizes the main advances in mineral macroelements nutrition for dairy cattle, as well as their requirements, main sources, functions, absorption, excess and interactions with other mineral elements.
Keywords: Bioavailability. Calcium. Phosphor. Mineralization. Equations.
Introdução
As exigências nutricionais é o aspecto que mais evoluiu nas últimas décadas, pesquisas e avanços em metodologias permitiram entender melhor a bioquímica de todo o metabolismo das vacas. Dentro os nutrientes de extrema importância e que exercem múltiplas funções no organismo dos bovinos leiteiros estão os minerais. Estes avanços permitiram entendermos a função que cada elemento mineral (macro e microminerais) exerce no organismo das vacas, além do metabolismo de absorção de cada um deles, suas interações e os efeitos da deficiência ou excesso na dieta.
A suplementação dos elementos minerais para bovinos de leite é essencial para o crescimento, produção e sanidade dos rebanhos, pois estes elementos não são sintetizados pelo organismo, e suas principais funções são de componentes estruturais de órgãos e tecidos, e fluidos corporais que podem ser catalisados em cofatores dos sistemas hormonais e enzimáticos (SILVA-BUENO et al., 2019).
Entretanto, a suplementação de minerais deve ser realizada de acordo com a necessidade nutricional das vacas, que varia em função da idade, estágio de lactação, composição da dieta e condição de saúde (RIET-CORREA, 2007). Na suplementação mineral é importante levar em conta a quantidade de nutrientes que o animal necessita e a quantidade presente na dieta, para não ocorrer o super ou sub suplementação.
Diante deste contexto, este estudo tem como objetivo reunir os principais avanços na pesquisa sobre a nutrição dos macrominerais para bovinos leiteiros, abordando sobre as exigências (manutenção, crescimento, lactação, gestação e produção), principais funções, metabolismo de absorção, interações com outros elementos e sinais clínicos de deficiências e excessos destes elementos na dieta dos bovinos leiteiros.
Desenvolvimento
Macrominerais essenciais para bovinos leiteiros
Elementos minerais são classificados como essenciais para todos os animais, pois exercem influência direta sobre a eficiência na produção. Aproximadamente, 5% do peso vivo de uma vaca consiste em mineral. Pelo menos, 15 elementos minerais são reconhecidos como nutricionalmente essenciais para os ruminantes dentre os quais existem 7 macroelementos: cálcio (Ca), fósforo (P), potássio (K), sódio (Na), cloro (Cl), magnésio (Mg) e enxofre (S) (McDOWELL, 1999).
As concentrações de cada elemento mineral presente nos alimentos têm grande amplitude de variação, com interferência de fatores ligados a fertilidade e tipo de solo, processos de adubações, sazonalidade anual, espécie e idade do tipo de forragem e metodologia de processamento (NRC, 2001).
Cálcio
O cálcio (Ca) representa 1,5% do peso do animal, sendo que aproximadamente 99% são encontrados nos ossos e dentes, e o restante nos fluidos corporais (WILKENS et al., 2012). Nos ossos, o cálcio atribui rigidez, e tem também o papel de manter as reservas para promover a homeostase (PEACOCK, 2010). Nos fluidos corporais, o cálcio está presente em três diferentes formas: na forma ionizada ou livre (Ca), representando cerca de 50% do total presente nos fluidos; 45% do cálcio está ligado a proteínas, principalmente à albumina; e os 5% restantes estão complexados com outros compostos como fosfatos e bicarbonatos (HANSEN et al., 2000; SARWAR et al., 2000).
Normalmente, a deficiência de cálcio em vacas leiteiras ocorre no período pré-parto, para o desenvolvimento do terneiro, e no pós-parto para a lactação (LEAN et al., 2006). Devido a esta deficiência, o organismo ativa mecanismos que regulam as concentrações de Ca sanguíneo (homeostase), que envolvem a ação de três hormônios, o paratormônio (PTH), o calcitriol e a calcitonina, e da vitamina D. Quando estes mecanismos falham, os animais podem desenvolver distúrbios metabólicos que causam doenças como metrite, mastite e retenção de placenta, uma vez que o sistema de defesa se apresenta debilitado e a contratilidade muscular diminuída (WEILLER 2015).
O cálcio está diretamente relacionado com o sistema imunológico das vacas. Segundo estudo realizado na Universidade de Cornell (USA), vacas com hipocalcemia tiveram 8,1 vezes mais chances de ter mastite clínica, 7,2 vezes mais chances de parto distócico e 5,7 vezes mais chances de sofrer retenção de placenta do que vacas com exigências supridas (CURTIS et al., 1983).
O sistema imunológico é composto por uma variedade de células capazes de combater ou eliminar microrganismos invasores que causam danos. O adequado funcionamento destes mecanismos de defesa é responsável por garantir a saúde dos bovinos leiteiros, pois evita que fatores nocivos culminem em doenças. Dentre estes agentes nocivos, os mais presentes são as bactérias, que ao entrarem em contato com um tecido, desencadeiam uma série de sinalizações entre células do sistema imunológico intencionadas para eliminá-lo (SORDILLO et al., 1997).
Entretanto, para que as células exerçam estas funções de sinalização e proteção contra agentes nocivos, há necessidade de influxo de Ca2+ para dentro das células (GOFF, 2008). A ligação dos receptores de células do sistema imunológico com bactéria nociva aciona uma cascata de sinalização, resultando no aumento de Ca2+ no citosol e diminuição de Ca2+ nas reservas do retículo endoplasmático (MARTINEZ et al., 2012). Essa redução dentro do retículo se restabelece através da ativação de canais de cálcio, o que promove a entrada de Ca+2 do espaço extracelular para o espaço intracelular (BURGOS et al., 2011). A diminuição das reservas de Ca2+ prejudica de forma direta a resposta celular, contribuindo para um estado de supressão da resposta imune.
A influência do cálcio na resposta imune é um exemplo da importância que este elemento exerce no organismo das vacas, na Tabela 1 são apresentadas as principais funções, mecanismo de absorção, sinais de deficiências e excesso nas dietas.
Tabela 1 – Principais funções, mecanismos de absorção, sinais de deficiência e excesso do cálcio.
Cálcio |
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Função |
Formação dos tecidos esqueléticos, transmissão de impulsos do tecido nervoso, excitação da contração do músculo esquelético e cardíaco, coagulação do sangue e componente do leite. O Ca intracelular, está envolvido na atividade de uma ampla gama de enzimas. |
Absorção |
Pode ocorrer por transporte passivo entre as células epiteliais através de qualquer porção do trato digestivo, mas o transporte ativo de Ca é a principal via de absorção, e esse processo é controlado por hormônio derivado da vitamina D. Absorção ruminal é insignificante. |
Deficiência |
Crescimento retardado, raquitismo, osteomalácia e imunossupressão. |
Excesso |
Geralmente não está associado a nenhuma toxicidade específica. O nível máximo tolerável para Ca em ruminantes foi fixado em 1,5% da MS da dieta. O excesso de Ca pode interferir na absorção de minerais (especialmente Zn e Se). |
Fonte: adaptado de NASEM 2021.
Coeficientes de absorção (CA’s) e Fontes de cálcio
O Coeficiente de absorção (CA) é a relação entre a quantidade consumida e a quantidade que será absorvida no trato digestivo da vaca. Esse coeficiente também é chamado de disponibilidade verdadeira ou biodisponibilidade do elemento mineral. O NASEM (2021) trouxe algumas atualizações dos CA’s para o cálcio (Tabela 2).
Tabela 2 – Atualização nos Coeficientes de absorção (CA) para cálcio de diferentes ingredientes.
CA |
|||
Fontes de Cálcio |
NRC (2001) |
NASEM (2021) |
|
Carbonato de cálcio |
0,75 |
0,50 |
|
Cloreto de cálcio diidratado |
0,95 |
0,60 |
|
Hidróxido de cálcio |
0,55 |
0,60 |
|
Óxido de cálcio |
0,50 |
0,33 |
|
Fosfato de cálcio (monobásico) |
0,95 |
0,60 |
|
Sulfato de cálcio diidratado |
0,70 |
0,60 |
|
Fosfato dicálcico (dibásico) |
0,94 |
0,60 |
|
Calcário dolomítico |
0,60 |
0,35 |
|
Calcário, moído |
0,70 |
0,45 |
|
Fosfato, difluorado |
0,70 |
0,45 |
|
Rocha de fosfato |
0,30 |
0,22 |
Fonte: NASEM (2021).
A literatura apresenta vários trabalhos estimando a absorção do Ca em ruminantes, porém é possível observar uma grande variação nos resultados (SIGNORETTI et al., 1999). Muitas dessas variações são oriundas de fatores ainda não conhecidos, e outras por fatores conhecidos, como a ingestão de Ca, metabolismo de Ca, idade do animal, fonte e fórmula química que o Ca está na dieta, metabolismo da vitamina D e inter-relação com outros elementos inorgânicos (McDOWELL et al., 1983).
Exigências de Ca
Um sistema fatorial é usado para estimar as quantidades de Ca absorvido necessário para atender as exigências de mantença, crescimento, gestação e lactação segundo o NRC (2001).
As exigências para manutenção é a quantidade de Ca absorvido que é necessária para repor as perdas na urina e nas fezes. As perdas urinárias são relativamente baixas e, portanto, são ignoradas. O NASEM (2021) estabeleceu as perdas metabólicas fecais diárias em 0,0154 g Ca/kg de peso corporal (PC) para novilhas em crescimento e vacas secas e 0,031 g Ca/kg PC em vacas em lactação.
Para bovinos em crescimento, a deposição de Ca no osso é o principal fator que eleva a necessidade de Ca. Vacas em crescimento requerem mais Ca quando são jovens e acumulam no osso e menos quando se aproximam do peso corporal adulto. Na gestação, as exigências de Ca absorvido para o feto em desenvolvimento requer uma quantidade insignificante de Ca até o último trimestre de gestação (após o 190º dia de gestação), quando o esqueleto fetal começa a se calcificar, onde a necessidade de Ca absorvido para a gravidez pode exceder 10 g/d (NASEM, 2021).
As necessidades de Ca absorvido para lactação foram 1,22 g Ca/kg de leite para vacas Holandesas, 1,45 g Ca/kg para vacas Jersey e 1,37 g/kg para outras raças (NRC, 2001). As respectivas equações para as exigências de Ca absorvido nas fases de mantença, crescimento, gestação e lactação são:
Mantença (g/dia) = 0,90 x IMS
Crescimento (g/dia) = ((9,83 x PVM-0,22) x PC-0,22) x GPV
Gestação (g/dia) = (0,02456 e(0,05581 – 0,00007t)t – 0,02456 e(0,05581 – 0,00007(t-1))(t-1)) x (PC/715)
Lactação: Ca leite (g Ca/kg de leite) = 0,295 + 0,239 x (% proteína no leite)
Vai variar de 1,03 a 1,17 g Ca/kg de leite
Onde, IMS é ingestão de matéria seca; PVM é peso vivo a maturidade; PC é peso corporal; GPV é ganho de peso vivo; e, t é o dia de gestação.
Fósforo
O fósforo (P) tem mais funções biológicas conhecidas do que qualquer outro elemento mineral, além de ser o segundo elemento mineral mais abundante no organismo animal, cerca de 80% do P está nos ossos e dentes. Além de sua participação essencial no desenvolvimento e manutenção dos tecidos esqueléticos, funciona como um componente dos ácidos nucléicos que são essenciais para o crescimento e diferenciação celular. Em conjunto com outros elementos, tem também um papel na regulação osmótica e equilíbrio ácido-base (NASEM, 2021).
O P é também exigido pelos microrganismos do rúmen para o crescimento e metabolismo celular (NRC, 2000). Pesquisa demostrou que quantidades insuficientes de P no rúmen pode reduzir a digestibilidade da fibra, uma dieta com 2,4 g/kg de MS de P apresentou menor digestibilidade da fibra em detergente neutro (FDN) do que uma dieta semelhante com 3,4 g/kg de MS de P quando fornecida a vacas leiteiras (PUGGAARD et al., 2011). Demais aspectos fundamentais do metabolismo do P estão presentes na Tabela 3.
Tabela 3 – Principais funções, mecanismos de absorção, sinais de deficiência e excesso do fósforo.
Fósforo |
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Função |
Componente em todas as células do corpo. A fosforilação é um regulador primário de inúmeras enzimas. P também está envolvido no equilíbrio ácido-base do sangue e outros fluidos corporais. Os microrganismos do rúmen também necessitam de P, que também pode ser reciclado pela saliva. |
Absorção |
A absorção de P ocorre principalmente no intestino delgado, com apenas pequenas quantidades absorvidas do rúmen, omaso e abomaso. A digestibilidade aparente do Ca e do P estão positivamente correlacionadas. |
Deficiência |
Sinais de deficiência incluem falta de parcimônia, inapetência, baixo crescimento e produção de leite reduzida, raquitismo. |
Excesso |
A alimentação prolongada com excesso de P pode causar problemas no metabolismo do cálcio, induzindo reabsorção óssea excessiva e cálculos urinários. A alta ingestão de P (>80 g/d) no pré-parto podem aumentar a incidência de febre do leite e hipocalcemia. |
Fonte: Adaptado do NASEM (2021).
Coeficientes de absorção (CA’s) e Fontes de fósforo
A quantidade de P que será absorvida no trato digestivo pode modificar-se com a fonte de P (Tabela 4), quantidade de P consumida, relação Ca:P, status de vitamina D, pH intestinal, idade do animal, ingestão dietética de outros minerais, fórmula química na qual ocorre a dieta, variação entre animais e níveis dietéticos de Ca, Fe, Al, Mn, K, Mg e gordura (ARC, 1980; McDOWELL et al., 1983; HORST, 1986; REID et al., 1987; NRC, 1989).
Tabela 4 – Principais fontes de P utilizadas na nutrição, sua concentração e coeficientes de absorção.
Fontes |
% |
CA |
Fosfato de amônio (dibásico) |
20,6 |
0,80 |
Fosfato de amônio (monobásico) |
24,7 |
0,80 |
Farinha de osso |
12,9 |
0,80 |
Fosfato de cálcio (dibásico) |
19,3 |
0,75 |
Fosfato de cálcio (monobásico) |
21,6 |
0,80 |
Fosfato, difluorado |
18,0 |
0,65 |
Fosfato, monossódico |
22,5 |
0,90 |
Ácido fosfórico |
31,6 |
0,90 |
Tripolifosfato de sódio |
25,0 |
0,75 |
Fonte: NASEM (2021).
Pressupõe-se que a absorção ocorra principalmente no duodeno e jejuno, tendo como não ruminantes, dois mecanismos. Por transporte ativo, dependente de vitamina D é percebível quando os animais são alimentados com dietas com baixo teor de P. Já a absorção passiva predomina quando quantidades adequadas ou excessivas de P potencialmente absorvível são consumidos, e a absorção é proporcional ao gradiente de concentração entre o lúmen do intestino delgado e o plasma sanguíneo (NASEM, 2021).
Exigências de P
Para determinar as exigências de manutenção de P para vacas leiteiras foi considerado a perda endógena urinária de P em 0,6 mg P absorvido/kg PC, diferente dos 2 mg P/kg PC do NRC 2001. Já a perda de P fecal está associada a detritos microbianos e purinas e pirimidinas de ácidos nucleicos. A outra porção de P fecal endógeno inclui células descamadas, secreções digestivas e P reciclado não absorvido, o que torna difícil de estimar. Portanto, o P fecal endógeno foi estimado a partir do CMS como feito anteriormente (NRC, 2001). Para definir a exigência de P fecal endógeno para vacas secas em 1,0 g P absorvido/kg CMS. Segue as equações para estimar as exigências de P para manutenção, crescimento, gestação e lactação:
Manutenção:
Novilhas em crescimento (g/d) = 0,8 x IMS + 0,0006 x PC
Vacas adultas (g/d) = 1,0 x IMS + 0,0006 x PC
Crescimento (g/d) = 1,2 + ((4,635 x PVM0,22)(PC-0,22)) x GPV
Gestação (g/d) = (0,02743 e(0,05527 – 0,000075t)t – 0,02743 e(0,05527 – 0,000075(t-1))(t-1) x (PC/715)
Lactação (g/d) = 0,90 x PL (kg/dia)
Onde, IMS é ingestão de matéria seca; PVM é peso vivo a maturidade; PC é peso corporal; GPV é ganho de peso vivo; PL é produção de leite e, t é o dia de gestação;
Sódio
Os bovinos evoluíram com o consumo de alimentos com baixo teor de Na, assim, eles desenvolveram processos absortivos eficientes e uma habilidade de conservar Na via renal. Além disso, 30 a 50% do Na corporal total está em uma fração fixa na estrutura cristalina do osso. O Na também desempenha um papel indispensável na enzima adenosina trifosfato de sódio-potássio (ATPase) responsável pela criação de gradientes elétricos para o transporte de nutrientes nas células, permitindo o transporte de glicose, aminoácidos (AAs) e fosfato para dentro das células e íons hidrogênio (H), Ca, bicarbonato, K e Cl para fora das células (NASEM, 2021).
O Na é o cátion predominante no fluído ruminal com teor típico de 80 a 90 mEq/L, mas a faixa pode ser de 50 a 140 mEq/L, sendo esta concentração fortemente correlacionada negativamente com as concentrações de K (CATTERTON e ERDMAN, 2016). O aumento de K na dieta estimula a absorção de Na pela parede do rúmen e reduzem a concentração de Na no rúmen para manter a neutralidade elétrica e osmótica (MARTENS e BLUME, 1987). As principais considerações sobre o Na estão na Tabela 5.
Tabela 5 – Principais funções, mecanismos de absorção, sinais de deficiência e excesso do sódio.
Sódio |
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Função |
A função cardíaca e a condução e transmissão dos impulsos nervosos dependem do equilíbrio adequado de Na e K. Também desempenha um papel indispensável na enzima adenosina trifosfato de sódio-potássio. |
Absorção |
A absorção ocorre em todo o trato digestivo, e o Na geralmente é considerado completamente disponível. |
Deficiência |
Perda de apetite; perda rápida de PC; uma aparência pobre e abatida; olhos sem brilho; e pelagem áspera. |
Excesso |
Pode aumentar a incidência/gravidade do edema do úbere. Um fator que influencia o grau de exposição da intoxicação é a disponibilidade e qualidade da água. O NRC (2005) estabeleceu limites em 3% da MS da dieta para bovinos em lactação e 4,5% para crescimento. |
Fonte: Adaptado do NASEM (2021).
Coeficientes de absorção (CA’s) e Fontes de Na
O NRC 2001 estabeleceu um CA de 90%, porém o coeficiente de regressão de 0,98 para o Na absorvido versus o Na dietético não foi estatisticamente diferente de 1, implicando que a absorção real é de 100%. Além disso, o Na presente na dieta das vacas é solubilizado e liberado na matriz líquida da digesta e permanece prontamente disponível para absorção. Os alimentos comumente usados em dietas para gado leiteiro não contêm Na suficiente para atender às necessidades, e as fontes suplementares normalmente respondem pela maior parte da ingestão total de Na de um animal. O cloreto de sódio (NaCl) é o mais utilizado na suplementação de vacas leiteiras, e seu Na é considerado 100% disponível. A eficiência de absorção de Na de outros sais por exemplo, bicarbonato de sódio (NaHCO₃), carbonato de sódio (Na₂CO₃) e o sesquicarbonato de sódio (Na₃H(CO₃)₂) também são considerados 100% (NASEM, 2021).
Exigências de Na
As exigências de Na para manutenção são iguais a ingestão menos as perdas urinarias e fecal. A excreção urinária de Na depende das taxas relativas de excreção de outros íons fortes (K* e Cl) para manter a neutralidade eletroquímica na urina e o equilíbrio ácido-base da vaca. Devido a essas inter-relações, não é possível desenvolver uma estimativa consistente da excreção urinária endógena. Por isso, a estimativa das exigências de Na de manutenção é baseada apenas nas inevitáveis perdas nas fezes. A excreção fecal metabólica de Na foi estimada a partir dos resultados de 137 medições individuais de digestibilidade de Na em oito experimentos em que as vacas foram alimentadas com dietas variando de 0,27 a 1,17% da MS de Na. A necessidade metabólica fecal foi determinada pela regressão da absorção de Na sobre a ingestão de Na, como apresentado a seguir (NASEM, 2021):
Mantença (g/d) = 1,45 x IMS
Crescimento (g/d) = 1,4 x GPV
Gestação (g/d) (>190 dias) = 1,4 x (PC/715)
Lactação (g/d) = 0,4 x PL
Temp. de 25 a 30ºC adicionar 0,10g/100 kg de PV
Temp. acima de 30ºC adicionar 0,50 g/100 kg de PV
Onde, IMS é ingestão de matéria seca; PC é peso corporal; GPV é ganho de peso vivo e, PL é produção de leite.
A sudorese, ou seja, as perdas por transpiração podem influenciar as exigências de Na para bovinos leiteiros, este mecanismo para auxiliar no equilíbrio térmico, inclui a secreção de Na e outros eletrólitos. Com base nas recomendações do Agricultural Research Council (ARC, 1980), sugeriu que um incremento adicional de 0,10 e 0,50 g Na/100 kg PC fosse fornecido aos animais mantidos em temperaturas ambientes de 25°C a 30°C e >30 °C, respectivamente.
Entretanto, com base nas taxas de sudorese relatadas em vacas leiteiras durante o estresse térmico que foi amenizado pelo resfriamento evaporativo (DIKMEN et al., 2015), as perdas de Na no suor seriam mínimas. Por isso há necessidade de dados mais confiáveis usando taxas de sudorese e composição do suor medidos simultaneamente antes que uma necessidade de Na durante o estresse térmico possa ser estabelecida (NASEM, 2021).
Magnésio
Grande parte do magnésio (Mg) presente no corpo dos bovinos está nos ossos e dentes (de 60 a 70%) e exerce função estrutural. Outros 30% são encontrados no espaço intracelular (ICS), mas apenas 1-5% do Mg intracelular está na forma ionizada. Entre 20 e 40% do plasma Mg está ligado à albumina e globulina e cerca de 10% forma complexos com pequenos ânions como citrato, fosfato e bicarbonato, de modo que 50-70% são ionizados (MARTENS et al., 2018).
O Mg é um importante cátion intracelular que é um cofator para reações enzimáticas em todas as principais vias metabólicas. O Mg extracelular é vital para a condução nervosa normal, função muscular e formação mineral óssea e está envolvido na homeostase de Ca e P. Baixas concentrações de Mg sérico atenuam a liberação de paratormônio (PTH) em resposta a baixos níveis de Ca (TAKATSUKI et al., 1980). Na Tabela 6 estão as principais considerações sobre o Mg.
Tabela 6 – Principais funções, mecanismos de absorção, sinais de deficiência e excesso do magnésio.
Magnésio |
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Função |
O Mg é um cofator para reações enzimáticas em todas as principais vias metabólicas. O Mg extracelular é vital para a condução nervosa, função muscular e formação óssea e está envolvido na homeostase de Ca e P. |
Absorção |
O Mg é absorvido principalmente no intestino delgado em bezerros jovens. À medida que o rúmen e o retículo se desenvolvem, eles se tornam o principal local de absorção, podendo ocorrer também no intestino grosso. |
Deficiência |
Uma deficiência clínica de Mg resulta em espasmos musculares, hiperexcitabilidade, convulsões e, muitas vezes, morte. |
Excesso |
Os efeitos negativos do alto Mg são geralmente redução do consumo de ração, redução da digestibilidade da dieta e diarreia osmótica. |
Fonte: NASEM (2021).
Coeficientes de absorção (CA’s) e Fontes de Mg
A absorção de Mg é influenciada por outros elementos. O K presente na dieta é um antagonista significativo da absorção de Mg, pois no rúmen interrompe o gradiente elétrico necessário para ocorrer a absorção de Mg (WEISS, 2004; MARTENS et al., 2018). A ingestão inadequada de Na aumenta a concentração de K no líquido ruminal (MARTENS et al., 1987) e, consequentemente, também reduz a absorção de Mg.
Fontenot et al. (1989) também sugeriram que altas concentrações de nitrogênio na dieta, ácidos orgânicos e ácidos graxos de cadeia longa podem reduzir a absorção do Mg. Segundo os mesmos autores, elevados níveis de P na dieta podem reduzir a absorção de Mg, por competirem por sítios de absorção.
Outros fatores também podem influenciar na absorção de Mg, assumindo uma redução de 20% na absorção de Mg quando a gordura suplementar é fornecida, assim como o fornecimento de ionóforos aumentou a absorção aparente de Mg para bovinos de corte e leite 10 a 28% quando o magnésio óxido foi alimentado. No entanto, a monensina reduziu a absorção de Mg em 23% quando o sulfato de magnésio foi administrado (TEBBE et al., 2018). Embora estes fatores de influência, o NASEM (2021) assume CA semelhantes para as diferentes fontes de Mg.
Exigências de Mg
Uma combinação de estudos foram utilizados para predizer as exigências de Mg para novilhas, vacas secas e vacas em lactação (WEISS, 2004; HOLTENIUS et al., 2008; SCHONEWILLE et al., 2008). Segue as equações adotadas pelo NASEM (2021) para predizer as exigências de Mg para manutenção, crescimento, gestação e lactação de bovinos leiteiros:
Mantença (g/d) = 0,3 x IMS + 0,0007 x PC
Crescimento (g/d) = 0,45 x GPV
Gestação (g/d) (>190 dias) = 0,3 x (PC/715)
Lactação (g/d) = 0,11 x PL
Onde, IMS é ingestão de matéria seca; PC é peso corporal; GPV é ganho de peso vivo e, PL é produção de leite.
Cloro
O cloro (Cl) é o principal ânion do organismo dos bovinos envolvido na regulação da pressão osmótica, constituindo mais de 60% do total de ânions equivalentes no líquido extracelular. É essencial para o transporte de dióxido de carbono e oxigênio, o principal ânion nas secreções gástricas. É necessário para a ativação da amilase pancreática, e compostos clorados são produzidos por algumas células fagocitárias para matar patógenos. As concentrações típicas de Cl são de 90 e 110 mEq/L no plasma sanguíneo e 10 a 30 mEq/L no líquido ruminal (NASEM, 2021). Embora existam poucas pesquisas sobre metabolismo do Cl, exerce papel importante na nutrição de bovinos leiteiros (Tabela 7).
Tabela 7 – Principais funções, mecanismos de absorção, sinais de deficiência e excesso do cloro.
Cloro |
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Função |
O Cl é o principal ânion do corpo envolvido na regulação da pressão osmótica. |
Absorção |
O Cl de fontes inorgânicas e alimentos comuns é liberado livremente na fase líquida da digesta e prontamente absorvido. |
Deficiência |
Os sinais clínicos em bezerros foram anorexia, perda de peso, letargia, polidipsia leve e poliúria leve. Em adultos, apetite depravado, letargia, hipofagia, emagrecimento, hipogalactia, constipação e depressão cardiovascular. |
Excesso |
Altas concentrações, na ausência de um cátion neutralizante (Na), podem causar distúrbios do equilíbrio ácido-base. A nível máximo não foi determinado. |
Fonte: Adaptado de NASEM (2021).
Coeficientes de absorção (CA’s) e Fontes de Cl
Existem poucas pesquisas sobre o CA do Cl em ruminantes, principalmente devido à ampla disponibilidade de fontes inorgânicas de baixo custo (NaCl). O Cl de fontes inorgânicas e alimentos comuns é liberado livremente na fase líquida da digesta e prontamente absorvido (UNDERWOOD, 1981). A eficiência de absorção encontrada em estimativas foi de 85 a 91% em bovinos e ovinos alimentados com dietas mistas (ARC, 1980). Fatores como lactação, gestação, e crescimento afetando a necessidade de Cl e não influenciam na eficiência da absorção de Cl. Com base nos estudos analisados pelo NASEM (2021), o comitê adotou um CA para Cl de 92%, atribuído para todos os ingredientes da dieta.
Exigências de Cl
As exigências de CI para diferentes categorias de bovinos leiteiros, como citado anteriormente, são os menos estudados de qualquer íon forte, porém seus papéis fisiológicos e inter-relações com Na e K são extremamente importantes. Normalmente, o CI é fornecido na dieta como NaCl, que é solubilizado, liberando o íon CI para absorção. As equações para estimar as exigências adotadas pelo NASEM (2021) estão a seguir:
Mantença (g/d) = 1,11 x IMS
Crescimento (g/d) = 1,0 x GPV
Gestação (>190 dias) = 1,0 x (PC/715)
Lactação (g/d) = 1,0 x PL
Onde, IMS é ingestão de matéria seca; PC é peso corporal; GPV é ganho de peso vivo e, PL é produção de leite.
Potássio
O potássio (K) é o terceiro mineral mais abundante no organismo das vacas, tendo de ser fornecido diariamente, pois há pouco armazenamento no organismo e sua necessidade é alta.
É o principal eletrólito intracelular com concentrações na faixa de 150 a 155 mEq/L. Em comparação ao Na e Cl, as concentrações extracelulares de K são baixas (cerca de 5 mEq/L). A saliva normalmente contém <10 mEq/L, enquanto as concentrações no líquido ruminal variam de 40 a 100 mEq/L (CATTERTON e ERDMAN, 2016). Podemos observar as principais considerações sobre o K na Tabela 8.
Tabela 8 – Principais funções, mecanismos de absorção, sinais de deficiência e excesso do potássio.
Potássio |
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Função |
Envolvido na pressão osmótica e regulação ácido-base, equilíbrio hídrico, transmissão de impulsos nervosos, contração muscular e transporte de oxigênio e dióxido de carbono: como ativador ou cofator em muitas reações enzimáticas; na captação celular de AAs e síntese de proteínas. |
Absorção |
É absorvido principalmente no duodeno por difusão simples, e alguma absorção ocorre no jejuno, íleo e intestino grosso. |
Deficiência |
Declínio acentuado na ingestão de ração e água, redução do peso corporal e produção de leite, perda de brilho do pelo, diminuição da flexibilidade da pele. |
Excesso |
Reduz consumo, produção de leite e reduz a absorção de Mg. Podendo ocorrer (>500g de KCl) toxidade aguda e até morte com excesso de K via suplementação. |
Fonte: Adaptado do NASEM (2021).
Coeficientes de absorção (CA’s) e Fontes de K
Como o K é excretado principalmente na urina, a excreção urinária e a absorção aparente são critérios confiáveis para estimar a eficiência da absorção. O K suplementar de fontes inorgânicas como carbonato de potássio, cloreto de potássio e sulfato de potássio são altamente solúvel e prontamente disponíveis para absorção. O CA para K é de 100% para todos os alimentos e fontes minerais (NASEM, 2021).
O K é absorvido principalmente no duodeno por difusão simples, e alguma absorção ocorre no jejuno, íleo e intestino grosso. A principal via de excreção do excesso de K absorvido é a urina. Esta via está principalmente sob regulação pela aldosterona, que aumenta a reabsorção de sódio no rim com a excreção concomitante de K. O estado ácido-básico do sangue também afeta a excreção urinária de K (MCGUIRK e BUTLER, 1980).
Existe uma relação distinta entre o excesso de cátions como Na e K e o pH urinário (HU e MURPHY, 2004). O excesso de K e Na é excretado na urina e resulta em aumento da secreção urinária de bicarbonato. Como o K é o principal cátion nas dietas de vacas leiteiras, as respostas de ingestão de K podem estar diretamente relacionadas a mudanças no equilíbrio ácido-base urinário. O K fecal é principalmente de perdas endógenas, pois a verdadeira digestibilidade do K se aproxima de 100% (NASEM, 2021).
Exigências de K
O NRC (2001) estabeleceu as exigências de K absorvido para termorregulação (sudorese) em 0,04 e 0,36 g/100 kg PC para bovinos mantidos em temperaturas ambientais de 25° a 30°C e >30°C, respectivamente. Considerando uma vaca leiteira de 700 kg de PC seria equivalente a 0,28 e 2,5 g/d, respectivamente, em uma vaca leiteira de 700 kg.
Segundo meta-análise realizada por Thompson et al. (2011) as perdas de K com a sudorese podem ser muito maiores. Por isso, o NASEM (2021) sugere a necessidade de novos estudos para estabelecer novos ajustes nas equações para perdas com sudorese. As demais equações para exigências de K estão a seguir:
Mantença:
Lactantes = 2,5 x IMS + 0,2 x PC
Não lactantes = 2,5 x IMS + 0,07 x PC
Crescimento (g/d) = 2,5 x GPV
Gestação (>190 dias) = 1,03 x PC/715
Lactação (g/d) = 1,5 x PL
Temp. de 25 a 30ºC adicionar 0,04g/100 kg de PV
Temp. acima de 30ºC adicionar 0,36 g/100 kg de PV
Onde, IMS é ingestão de matéria seca; PC é peso corporal; GPV é ganho de peso vivo e, PL é produção de leite e.
Relação com DCAD
A Diferença Cátion-Aniônica da Dieta (DCAD) foi discutida inicialmente no NRC de 2001. O DCAD é calculado como a diferença entre a soma dos cátions principais (Na e K) e a soma dos ânions principais (CI e às vezes S) e é expresso em miliequivalentes (mEq) por kg ou por 100 g de MS consumida (NASEM, 2021).
Segundo Iwaniuk e Erdman (2015) a cada 100 mEq/kg MS em DCAD houve um aumento linear de 0,03 no pH ruminal. Desse modo, o efeito geral dos efeitos do DCAD no desempenho animal é provavelmente devido a uma combinação de seus efeitos na fermentação ruminal e no estado ácido-base da vaca.
Segundo NASEM (2021) não há exigência fixa de DCAD para vacas em lactação. Em vez disso, o nível de alimentação escolhido deve ser determinado com base nas respostas no desempenho (produção de leite e gordura) em relação aos custos adicionados (CMS e suplementação de sal mineral). Um mínimo prático para DCAD seria baseado nas exigências para os minerais, K, Na, Cl e S. Por exemplo, uma vaca leiteira de 700 kg produzindo 50 kg de leite exigirá uma dieta contendo 1,11%, 0,25%, 0,33% e 0,20% de K, Na, Cl e S, respectivamente, e uma exigência mínima de DCAD seria 174 mEq/kg de MS da dieta.
Enxofre
As funções do enxofre (S) no organismo dos bovinos são tão diversas como as proteínas das quais faz parte, ligado aos chamados aminoácidos sulfurosos, cerca de 15% do corpo é S. Estando presente em todos os tecidos do organismo, representando cerca de 0,5 a 2,0% desses. Os aminoácidos sulfurosos mais conhecidos são a metionina, cistina, cisteína e taurina. Ruminantes apresentam particularidades na utilização do S, uma vez que possuem uma população microbiana capaz de incorporar fontes inorgânicas de enxofre na forma de proteína microbiana (NASEM, 2021).
O S é também utilizado para a proteção dos bovinos com ingestão excessiva de cobre, cádmio, zinco e outros, protegendo os tecidos da intoxicação por estes minerais no caso de elevada ingestão dos mesmos (UNDERWOOD e SUTTLE, 1999). A suplementação deve ser contínua e será ineficaz se outros fatores estiverem limitando a atividade microbiana ruminal, podendo frequentemente ser necessário prover fontes de carboidratos fermentescíveis e nitrogênio (ureia), juntamente com o suplemento de enxofre (SILVA, 2008). Desta forma, observando os principais aspectos do metabolismo do S (Tabela 9), fica evidente sua importância aos ruminantes.
Tabela 9 – Principais funções, mecanismos de absorção, sinais de deficiência e excesso do enxofre.
Enxofre |
|
Função |
Cerca de 15% do corpo é S, predominantemente na forma de AAs e o ácido amino sulfônico, taurina, e é um componente de tiamina e biotina. |
Absorção |
São absorvidos pelas bactérias do rúmen ou no intestino na forma de AAs. |
Deficiência |
Pode estar relacionada a níveis baixos de PB na dieta. Níveis baixos de consumo podem limitar a produção de proteína microbiana. |
Excesso |
Pode causar deficiências de outros minerais. Fornecer aproximadamente 4% de S reduz a absorção de Cu e Se, e também pode afetar a retenção de Mn e Zn em bovinos. A toxicidade clínica do S causa alterações neurológicas, incluindo cegueira, coma, espasmos musculares e decúbito. |
Fonte: Adaptado do NASEM (2021).
Coeficientes de absorção (CA’s) e Fontes de S
O S é absorvido principalmente como componente de moléculas orgânicas e, em formas inorgânicas como sulfatos, os quais são absorvidos com menor eficiência. Em ruminantes, o S inorgânico pode ser utilizado na síntese de compostos orgânicos, ou seja, aminoácidos sulfurados, pelos microrganismos do rúmen (NASEM, 2021).
Outro processo relevante é a reciclagem do S do plasma para o rúmen. A quantidade total de S reciclada contribui com aproximadamente 7 mg de S/dia/kg de PC (KANDYLIS, 1983).
Exigências de S
A exigência de S está diretamente correlacionada com a atividade dos microrganismos no rúmen, que transformam o S inorgânico em aminoácidos, incorporando-os à proteína microbiana (ARC, 1988). Bouchard e Conrad (1973) determinaram que 20% de S dietético foi adequado para manter a retenção máxima de S em vacas leiteiras no meio da lactação produzindo 30 a 37 kg de leite/d. Com base na falta de dados mais recentes, a exigência de S para todas as categorias de bovinos leiteiro permaneceu em 2g por kg de MS ingerida.
A necessidade dietética de S pela vaca é principalmente fornecer substrato adequado para garantir a síntese máxima de proteína microbiana, que por sua vez aumentará o fornecimento de compostos contendo S necessários às vacas (NASEM, 2021). O nível ótimo de síntese microbiana e captura de enxofre acontece quando a energia de fermentação, fonte de enxofre, nitrogênio e fósforo estão disponíveis em taxas iguais à capacidade cinética do rúmen e da biomassa microbiana (SILVA, 2008). A relação com nitrogênio (N:S) tem sido utilizada como guia para verificar se a quantidade de enxofre na dieta está adequada. Assim, para a utilização eficiente dos alimentos pelos bovinos, uma relação entre 10:1 a 12:1 segundo Bouchard e Conrad (1973). A equação para estimar a exigência de S é:
Total (g/d) = 2,0 x IMS
Onde, IMS é ingestão de matéria seca.
Considerações finais
Com este estudo, conclui-se que os avanços na nutrição mineral das vacas leiteiras são indispensáveis para formulação de dietas balanceadas, e para formulação de suplementos e/ou núcleos que atendam as necessidades atribuindo máximo desempenho e sanidade aos rebanhos.
Conflitos de interesse
Não houve conflito de interesses dos autores.
Contribuição dos autores
Matheus Lehnhart de Moraes – ideia original, leitura e interpretação das obras e escrita; Franciely Alves Costa – escrita, correções e revisão do texto.
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Recebido em 5 de fevereiro de 2023
Retornado para ajustes em 18 de março de 2023
Recebido com ajustes em 20 de março de 2023
Aceito em 21 de março de 2023