Avaliação do nivelamento dos dentes incisivos e principais doenças periodontais em equinos de tração e militares em município da Região Metropolitana do Sudoeste Maranhense

Revista Agrária Acadêmica

agrariacad.com

doi: 10.32406/v6n1/2023/93-102/agrariacad

 

Avaliação do nivelamento dos dentes incisivos e principais doenças periodontais em equinos de tração e militares em município da Região Metropolitana do Sudoeste Maranhense1. Evaluation of incisor teeth leveling and main periodontal diseases caused in traction and military equines in a municipality in the Metropolitan Region of Southwest Maranhense1.

 

Kryscia Beatriz Teixeira Araújo Varão2, Déborah Milhomem Silva2, Lorena da Silva Soares2, Kalyne Sousa dos Santos2, Vitória Baltazar Rodrigues2, Rafaella Brandão Silva2, Jailson Honorato3*

 

1- Parte do Projeto de Iniciação Científica da primeira autora
2- Curso de Medicina Veterinária, CCA, UEMASUL, Imperatriz, MA, Brasil.
3- Curso de Medicina Veterinária, Centro de Ciências Agrárias – CCA, Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão – UEMASUL, Imperatriz, MA, Brasil. *Autor para correspondência. E-mail: honorato@uemasul.edu.br

 

Resumo

 

Das enfermidades orais que afetam os equinos, as ocorrências dentárias são as mais relevantes na prática veterinária. O trabalho teve por objetivo a realização de avaliações da cavidade oral de equinos de tração e militares, com ênfase na análise do nivelamento dos dentes incisivos, para caracterizar as principais doenças periodontais acarretadas devido a sua alteração. Os procedimentos foram realizados na cidade de Imperatriz – MA, onde foram avaliados 41 cavalos, sendo 30 de tração e 11 de uso militar. Observou-se que as causas de desalinhamentos em ambos os grupos foram mordida em diagonal e em escada, curvatura ventral e dorsal, diastema, oligodontia, desgaste por aerofagia, braquignatismo e prognatismo. Em ambos os grupos foi identificada a presença de doença periodontal secundária à má oclusão ou diastema. Observa-se que a avaliação da cavidade oral dos cavalos é de extrema importância, pois por estes animais possuírem erupção contínua dos dentes, costumam apresentar alterações de oclusão, que podem levar a afecções mais graves, trazendo prejuízos a saúde dos mesmos.

Palavras-chave: Odontologia Veterinária. Odontograma. Cavalos. Dentes.

 

 

Abstract

 

Of the oral diseases that affect horses, dental occurrences are the most relevant in veterinary practice. The objective of this work was to carry out assessments of the oral cavity of traction horses and military personnel, with emphasis on the analysis of the leveling of the incisor teeth, in order to characterize the main periodontal diseases caused by their alteration. The procedures were carried out in the city of Imperatriz – MA, where 41 horses were evaluated, 30 for traction and 11 for military use. It was observed that the causes of misalignment in both groups were diagonal and ladder bite, ventral and dorsal curvature, diastema, oligodontia, wear due to aerophagia, brachygnathism and prognathism. In both groups, the presence of periodontal disease secondary to malocclusion or diastema was identified. It is observed that the evaluation of the oral cavity of horses is extremely important, because these animals have continuous eruption of teeth, they usually present occlusion changes, which can lead to more serious conditions, causing damage to their health.

Keywords: Veterinary Dentistry. Odontogram. Horses. Teeth.

 

 

Introdução

 

Atualmente, é perceptível a grande importância dos equinos em diversas atividades, sejam elas destinadas ao trabalho, produção ou ao esporte. Assim, o cavalo exerce um papel intrínseco no transporte como montaria, no exército com suas unidades de cavalaria e nos trabalhos agrícolas e de tração, o que resulta em proprietários e médicos veterinários mais vigilantes quanto às enfermidades que acometem esses animais. Em contrapartida, com o adestramento e confinamento precoce, o que implica em mudança de hábitos e ajuste nos padrões alimentares, pode haver o comprometimento da formação dentária natural e consequentemente a ocorrência de diversas alterações odontológicas (DIXON; DACRE, 2005).

As doenças dentárias que afetam os cavalos, estão entre as enfermidades dentárias mais relevantes na prática veterinária equina (DIXON; DACRE, 2005). Estes animais possuem uma cavidade bucal com grupos de dentes – incisivos (I), caninos (C), pré-molares (PM) e molares (M) – que apresentam funções específicas a fim de possibilitar a apreensão e a mastigação dos alimentos, sendo assim, chamados de heterodontes, Conforme a localização, os dentes incisivos se denominam em cada arcada: pinças, os dois dentes no plano médio; médios, os que se seguem as pinças; e cantos, os dois mais distais que se seguem ao médio (PENCE, 2002).

A dentição definitiva pode ser variável entre machos (40 a 44 dentes) e fêmeas (36 a 44 dentes). Isso porque as éguas normalmente não possuem os caninos e o primeiro pré-molar pode permanecer ausente em alguns animais. Ainda, os dentes dos equinos são considerados hipsodontes, o que significa que existe o processo de odontogênese mesmo após a eclosão e contato com o dente antagônico, ou seja, os dentes dos equinos estão constantemente se ajustando. Isso é o que permite predizer a idade destes animais, contudo, também pode predispor a algumas alterações odontológicas (PENCE, 2002).

A região periodontal dos equídeos é formada por um osso alveolar, local onde os dentes são alojados, cemento radicular, que é a substância que cobre a raiz do dente e o ligamento periodontal é onde encaixa o dente ao processo alveolar (TEN CATE, 2003). Ainda, a superfície dentária apresenta três tecidos dentários: a dentina, o esmalte e o cemento. O esmalte é a substância que faz do dente a estrutura mais resistente do organismo, está organizada em invaginações, que formam irregularidades na face oclusal aumentando o atrito e facilitando a abrasão dos alimentos. A dentina fica sob o esmalte e tem o papel de proteger o esmalte contra desgastes excessivos (FERRARIS; MUÑOZ, 2001).

O cemento é desgastado pelo atrito e a abrasão, o que leva a uma exposição da dentina da face oclusal, formando a superfície coronal secundária, que constitui a unidade funcional do dente hipsodonte. Ademais, o cemento cobre a raiz dos dentes e se encontra na superfície oclusal secundária, que é onde não há desgaste na sua extremidade, sendo o local de maior oclusão dos dentes com seu dente antagonista realizando a função de atrito durante o ciclo mastigatório (FERRARIS; MUÑOZ, 2001).

A cavidade oral do cavalo deve apresentar um alinhamento proporcional entre os dentes incisivos, pré-molares e molares e a articulação temporomandibular, para que seja promovida uma condição de conforto durante a mastigação, uma vez que forças desiguais refletindo sobre um dente ou sobre uma face do mesmo, geram desconforto, doença periodontal ou até uma fratura dentária (ALLEN, 2008).

As    afecções    em    dentes    incisivos ressaltam  a  necessidade  do  exame  odontológico  em animais  jovens,  com  intuito  de  prevenir  alterações  de desenvolvimento   e   redução   do   futuro   desempenho atlético (SILVA et al., 2021).

Desta forma, o objetivo foi realizar avaliações da cavidade oral de equinos de tração e militares do município, com ênfase na análise do nivelamento dos dentes incisivos e caracterizar as principais doenças periodontais acarretadas devido a sua alteração.

 

Material e métodos

 

Os procedimentos foram no quartel do 2º Esquadrão de Polícia Montada (EPMont) e em diversos bairros da cidade de Imperatriz – MA, município localizado no extremo oeste maranhense.

Foram avaliados 41 cavalos, onde 30 destes eram de tração (grupo 1) e 11 de uso militar (grupo 2). Houve consenso dos proprietários sobre o uso destes animais no presente estudo. Os animais foram identificados por função, nome, sexo, idade, pelagem e raça. A idade foi estimada de acordo com a observação da arcada dentária. O peso foi mensurado por meio de uma fita de perímetro torácico para pesagem de equinos e a altura por uma fita métrica.

Os cavalos de tração viviam em ambiente aberto na zona urbana da cidade e realizavam transporte, principalmente de cargas frigoríficas perecíveis, mudanças, encomendas, produtos de serrarias e areia. Destes, havia 12 fêmeas e 18 machos, de 2 a 9 anos de idade, sendo 17 de pelagem escura e 13 de pelagem clara, medindo desde 1,34 metros a 1,58 metros de altura e pesando de 170 kg a 540 kg, todos sem raça definida (SRD). Já os de uso militar, viviam em um curral na zona rural da cidade e eram utilizados para policiamento ostensivo. Destes, 3 eram fêmeas e 8 eram machos, de 8 a 27 anos de idade, sendo 7 de pelagem escura e 4 de pelagem clara, medindo de 1,45 a 1,66 metros de altura e pesando de 345 kg a 513 kg, todos sem raça definida (SRD).

Inicialmente, foi executada uma coleta de informações dos proprietários dos animais, levando em consideração o tipo e a quantidade de alimento recebida diariamente, frequência de correções odontológicas, protocolo de controle parasitário, e observação de alterações quanto à condução, mastigação, ganho/perda de peso e estado geral dos animais.

Para o exame físico geral dos equinos, utilizou-se um estetoscópio para a auscultação cardíaca e respiratória, realizou-se a avaliação do escore corporal utilizando a adaptação descrita por MacFadden (2005), bem como foi feita a mensuração da temperatura retal com um termômetro digital, e observação do grau de hidratação a partir da coloração e umidade da mucosa oral, juntamente com o tempo de preenchimento capilar (TPC). A análise do tamanho das fibras nas fezes não foi efetuada, uma vez que não se obteve permissão dos proprietários para a coleta de material diretamente da ampola retal.

Além disso, foi feito uma avaliação extraoral, com inspeção e palpação do crânio e da face dos animais, com o intuito de identificar assimetria entre os lados da face, edema, atrofia, aumento de volume, secreção nasal e/ou sensibilidade dolorosa à palpação, e avaliação do odor da cavidade oral.

Durante as avaliações dentárias não foi necessário o uso de contenção medicamentosa, uma vez que as contenções físicas se fizeram suficientes para o manuseio dos animais. Os dentes foram examinados de acordo com o sistema Triadan de classificação dentária e todas as alterações encontradas, tanto no exame geral quanto no exame oral, foram registradas em prontuários individuais (odontogramas).

Para a visualização de toda a cavidade oral, utilizou-se de um espéculo oral e uma lanterna clínica. A limpeza da cavidade foi feita com o uso de um borrifador e água. Em seguida, com o auxílio de um apoiador odontológico improvisado, a cabeça do cavalo foi mantida em posição neutra, que é a mesma que é adotada quando ele está mastigando, e os lábios superiores e inferiores foram afastados, para a avaliação do tipo de oclusão dos incisivos e do movimento rostrocaudal da mandíbula. Ainda, foi observada a região da gengiva.

Para a identificação do alinhamento e do ângulo dos incisivos, o gabarito odontológico foi posicionado entre as superfícies oclusais desses dentes.

Ainda, a partir da análise dos dados, foi possível interligar a presença das alterações oclusais e comportamentais com possíveis doenças periodontais. Para a obtenção dos resultados utilizou-se o método de frequência simples e estatística descritiva.

 

Resultados

 

Constatou-se na anamnese (Tabela 1 e 2) que os cavalos de tração alimentavam-se principalmente de concentrados como palha de arroz, milho quebrado, farelo de trigo e capim, cerca de duas vezes por dia; nunca receberam tratamento dentário; cerca de 16 cavalos (53,33%) apresentaram perda de peso nos últimos 6 meses; 13 (43,33%) demonstraram recusa durante a alimentação; 11 (36,67%) reagia contra embocaduras; 9 (30%) encontrou-se com postura anormal mesmo quando em repouso (cabeça baixa) e 1 (3,33%) praticava aerofagia. Já os cavalos de uso militar alimentavam-se de ração comercial e capim Brachiaria e Panicum maximum, três vezes ao dia; apenas 2 animais (18,18%) já receberam correção dentária; 4 (36,36%) apresentaram perda de peso; 6 (54,54%) não conseguia mastigar com eficiência; 8 (72,72%) recusava alimento; e 1 (9,09%) praticava aerofagia. ­­­­­Os proprietários de ambos os grupos alegaram que todos os animais estavam com vermifugação em dias.

 

Tabela 1 – Descrição de problemas apresentados pelos cavalos de uso de tração, relatados pelos proprietários na anamnese.
Total
N
%
Perda de peso
16
53,33%
Recusa de alimento
13
43,33%
Reação contra embocaduras
11
36,67%
Postura anormal
9
30%
Aerofagia
1
3,33%

 

Tabela 2 – Descrição de problemas apresentados pelos cavalos de uso militar, relatados pelos responsáveis do 2º EPMont na anamnese.
Total
N
%
Perda de peso
4
36,36%
Mastigação ineficiente
6
54,54%
Recusa de alimento
8
72,72%
Aerofagia
1
9,09%

 

Quanto às alterações encontradas no exame físico geral do grupo 1 (Gráfico 1), identificou-se que apenas 1 animal (3,33%) apresentava corrimento nasal não purulento; 10 (33,33%) apresentaram leve desidratação, 14 (46,66%) temperatura retal (TR) elevada, 5 (16,66%) reação de dor a palpação na região da cabeça e 2 (6,66%) halitose. Enquanto do grupo 2 (Gráfico 2) apenas 2 animais (18,8%) apresentaram dor durante o exame extraoral. Os dois grupos apresentaram escore corporal entre 3 e 7 (magro a moderado), e frequência cardíaca (FC) e respiratória (FR) dentro dos padrões considerados normais às condições fisiológicas dos cavalos examinados.

 

Gráfico 1 – Alterações identificadas no exame físico geral de animais de tração e de uso militar.

 

Em relação aos resultados das alterações oclusais (Tabela 3) evidenciadas, dentre os 30 cavalos destinados à tração avaliados, 6 (20%) possuíam dentes incisivos em formato normal, 1 (3,33%) tinha incisivos desalinhados de forma diagonal, curvatura dorsal, curvatura ventral e oligodontia associada a diastema, 5 (16,66%) apresentaram mordida em escada, 1 (3,33%) possuía desgaste dos incisivos superiores por aerofagia, 12 (40%) apresentaram-se como braquignatas e 2 (6,66%) como prognatas. Já dentre os 11 cavalos de uso militar, apenas 1 (9,09%) possuía dentes incisivos alinhados corretamente, enquanto 2 (18,18%) apresentaram mordida em diagonal, 1 (9,09%) em curvatura dorsal, 3 (27,27%) em escada, 1 (9,09%) tinha desgaste dos incisivos por aerofagia e 3 (27,27%) mostraram-se como prognatas.

 

Tabela 3 – Alterações oclusais observadas nos cavalos de tração e uso militar.
Incisivos
Cavalos de tração
Cavalos de uso militar
Formato normal
20%
9,09%
Mordida em diagonal
3,33%
18,18%
Curvatura dorsal
3,33%
9,09%
Curvatura ventral
3,33%
0%
Oligodontia + Diastema
3,33%
0%
Mordida em escada
16,66%
27,27%
Desgaste por aerofagia
3,33%
9,09%
Braquignatismo
40%
0%
Prognatismo
6,66%
27,27%

 

Quanto às afecções de periodonto (Tabela 4), constatou-se tanto gengivite quanto periodontite, sendo que 6 (20%) cavalos do grupo 1 e 4 (36,36%) do grupo 2 apresentaram periodontite; e 5 (16,66%) do grupo 1 apresentaram gengivite.

 

Tabela 4 – Resultado das afecções periodontais identificadas em cavalos de tração e de uso militar.
Afecções periodontais
Cavalos de tração
Cavalos de uso militar
Gengivite
16,66%
0%
Periodontite
20%
36,36%

 

Ao relacionar as alterações dos dentes incisivos com doença periodontal (Tabela 5), constatou-se que em 10 cavalos (33,33%) de tração a causa pode ser devido à má oclusão e em 1 (3,33%) cavalo à presença de diastema. Enquanto a causa em 4 cavalos (36,36%) de uso militar pode ser quanto à má oclusão.

 

Tabela 5 – Causas de possível doença periodontal identificada nos cavalos de tração e de uso militar.
Doença periodontal
Cavalos de tração
Cavalos de uso militar
Má oclusão
33,33%
36,36%
Diastema
3,33%
0%

 

Discussão

 

Segundo Easley (1996), os dentes incisivos dos cavalos são utilizados para apreensão e corte da forragem, no entanto, cavalos que não tem livre acesso ao pastoreio não utilizam os dentes incisivos para o corte, e devido à falta de atrito, isso pode tornar esses dentes mais longos que o considerado normal. Ainda, a forragem, por ser rica em sílica, deve provocar o desgaste dental quase que juntamente com o tempo de erupção, entretanto, o excesso de concentrados diminui o desgaste da linha oclusal e a excursão da mandíbula. Assim, evidenciou-se que o tipo de manejo de ambos os grupos de animais examinados, contribuiu para o desalinhamento dos dentes incisivos dos mesmos, bem como o tipo de alimento fornecido na dieta.

Lowder (2004) aborda que a principal queixa de equinos que são frequentemente levados ao veterinário é a perda de peso, e a alimentação inadequada e as parasitoses são as causas analisadas inicialmente, todavia, os distúrbios odontológicos também são responsáveis por levarem os animais a este quadro clínico. Tanto os cavalos de uso militar quanto os de uso de tração apresentaram perda de peso e queda no escore corporal, o que associado ao manejo nutricional, colaborou como um sugestivo de presença de alterações dentárias.

Os principais sinais clínicos encontrados durante a avaliação dos animais de uso de tração foram perda de peso, recusa durante a alimentação, reação contra embocaduras, alteração postural, corrimento nasal e dor à palpação facial; enquanto as encontradas na avaliação dos animais de uso militar foram perda de peso, mastigação ineficiente, aerofagia e dor à palpação facial; sendo estes os mesmos sinais relatados por Baker (1998) como indicativos de problema em toda a cavidade oral, incluindo dentes, gengiva e periodonto. Observou-se também alterações de temperatura retal e hidratação nos cavalos do grupo 1, no entanto, estes parâmetros foram associados ao fato de as avaliações terem sido realizadas durante o período de trabalho destes animais e às condições que estavam submetidos.

Quanto às alterações dentárias é importante salientar que muitos problemas podem ser relacionados à idade do animal, assim, os mais jovens são menos propensos a terem alterações dentárias (SCRUTCHFIELD, 2006). Desta forma, constatou-se que todos os animais, dos dois grupos, sem identificação de alteração no nivelamento dos dentes incisivos se encontravam em uma faixa etária de 2 a 5 anos de idade.

As principais alterações oclusais observadas nos cavalos de uso de tração foram:  mordida em diagonal, curvatura dorsal, curvatura ventral, mordida em escada, diastema, oligodontia, desgaste por aerofagia, braquignatismo e prognatismo. Já as observadas nos cavalos de uso militar foram: mordida em diagonal, curvatura dorsal, mordida em escada, desgaste por aerofagia e prognatismo.

A mordida em diagonal (Figura 1) se desenvolve em animais que mastigam apenas em uma direção, ocasionando um declive da superfície oclusal dos incisivos, onde os dentes superiores e os contralaterais inferiores encontram-se demasiadamente desenvolvidos, realizando uma união contralateral (SCRUTCHFIELD, 2006). Já a mordida em escada, por sua vez pode ocorrer devido a perdas do dente oposto, o que ocasiona um crescimento exacerbado do dente (GRAHAM, 2002).

 

Figura 1 – Cavalo de tração apresentando curvatura em diagonal dos incisivos. Foto: Autor.

 

As curvaturas dorsal e ventral ocorrem principalmente em animais que apresentam vícios de morder objetos duros, onde, no primeiro caso há desgaste excessivo dos incisivos centrais superiores e sobrecrescimento dos incisivos centrais e laterais inferiores, e no segundo caso, ocorre o oposto, há desgaste excessivo dos incisivos centrais inferiores e sobrecrescimento dos incisivos centrais e laterais superiores (SCRUTCHFIELD, 2006).

A diastema é caracterizada como um espaço entre os dentes adjacentes, que pode ter causa congênita ou adquirida, sendo na forma congênita comum a oligodontia, que é evidenciada pela ausência de um ou mais dentes, que é capaz de impulsionar o movimento dos dentes próximos para o preenchimento do espaço, ocasionando uma oclusão anormal (CARMALT, 2003).

O desgaste por aerofagia diz respeito a consequência do hábito de alguns cavalos engolirem ar, fazendo com que haja um desgaste irregular dos dentes (DIXON, 2011). Ademais, o braquignatismo (Figura 2) se apresenta como uma alteração congênita, onde os incisivos superiores se sobrepõem aos inferiores, acarretando um desgaste anormal dos dentes e dificultando no processo de apreensão dos alimentos. Enquanto no prognatismo (Figura 3), que também é uma alteração congênita, a maxila encontra-se em tamanho menor que a mandíbula (CARMALT, 2003).

 

Figura 2 – Cavalo de tração braquignata. Foto: Autor.

 

Figura 3 – Cavalo de uso militar prognata. Foto: Autor.

 

De acordo com Allen (2008), doença periodontal é uma enfermidade frequente em cavalos com mais de quinze anos de idade, que submete o animal a um estado inflamatório das estruturas periodontais, podendo levar à destruição do ligamento periodontal. Neste estudo, foi identificada a presença de doença periodontal em ambos os grupos de cavalos, que pode ser secundária à má oclusão, onde o animal realiza forças mastigatórias anormais, provocando um enfraquecimento do ligamento periodontal e dos tecidos próximos, levando a uma reação inflamatória e degeneração; e diastemas, onde se evidencia acúmulo de alimento, que encaminha o animal para uma predisposição à gengivite e periodontite. A gengivite é definida como a inflamação da gengiva que pode evoluir para uma periodontite, que é caracterizada como a inflamação do periodonto, que é formado pelo cemento, ligamento periodontal, pela gengiva e osso alveolar. Nesse sentido, é imperativo ressaltar que a falta de exame e tratamento odontológico pode levar ao acúmulo de bactérias na cavidade oral e levar à uma doença periodontal (CORREIA, 2014).

 

Conclusões

 

Com base nos resultados obtidos, observou-se que as principais causas de desalinhamentos dos incisivos encontradas tanto nas avaliações dentárias dos cavalos de tração quanto de uso militar, foram: mordida em diagonal, mordida em escada, curvatura ventral, curvatura dorsal, diastema, oligodontia, desgaste por aerofagia, braquignatismo e prognatismo. Considera-se que o sugestivo de doença periodontal observada em ambos os grupos de animais pode estar associada secundariamente às más oclusões dentárias e diastemas.

Os principais sinais clínicos detectados como indicativos de problema da cavidade oral de animais de tração foram perda de peso, recusa durante a alimentação, reação contra embocaduras, alteração postural, corrimento nasal e dor à palpação facial; enquanto as encontradas na avaliação dos animais de uso militar foram perda de peso, mastigação ineficiente, aerofagia e dor à palpação facial.

Desta forma, observa-se que a avaliação da cavidade oral dos equinos é de extrema importância, uma vez que estes animais, por possuírem erupção contínua dos dentes, costumam apresentar alterações de oclusão, que podem levar a afecções mais graves, trazendo prejuízos a saúde dos mesmos.

O conhecimento destes resultados pode auxiliar na conduta médico-veterinária mais adequada, beneficiando a saúde do animal, com qualidade de vida e desempenho satisfatório.

 

Conflitos de interesse

 

Não houve conflito de interesses dos autores.

 

Contribuição dos autores

 

Kryscia Beatriz Teixeira Araújo Varão – leitura e interpretação das obras, coleta de dados e interpretação de resultados, escrita; Déborah Milhomem Silva – coleta de dados; Lorena da Silva Soares – coleta de dados; Kalyne Sousa dos Santos – coleta de dados; Vitória Baltazar Rodrigues – coleta de dados; Rafaella Brandão Silva – coleta de dados; Jailson Honorato – ideia original, orientação, correção e revisão.

 

Referências bibliográficas

 

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Recebido em 16 de outubro de 2022

Retornado para ajustes em 29 de dezembro de 2022

Recebido com ajustes em 28 de março de 2023

Aceito em 18 de abril de 2023