Aplicação de cianamida hidrogenada e Budbreaker® na quebra da dormência e produção de BRS Cora (Vitis  labrusca L.), submetida a poda mista

Revista Agrária Acadêmica

agrariacad.com

doi: 10.32406/v6n4/2023/106-113/agrariacad

 

Aplicação de cianamida hidrogenada e Budbreaker® na quebra da dormência e produção de BRS Cora (Vitis  labrusca L.), submetida a poda mista. Application of hydrogenated cyanamide and Budbreaker® to break dormancy and produce of BRS Cora (Vitis  labrusca L.), subjected to mixed pruning.

 

Millena Parisotto Lerin1, Marco Aurélio de Freitas Fogaça2*, Renato  Lazzari3, Luis Henrique de Lima4, Giovani Dorigon5, Sandro Morandi6

 

1- Tecnóloga em Horticultura pelo IFRS – Campus Bento Gonçalves. E-mail: millilerin1@gmail.com
2*- Professor Doutor em Produção Vegetal – Instituto Federal de Ciência, Educação e Tecnologia do Rio Grande do Sul – IFRS – Campus Bento Gonçalves – Av. Osvaldo Aranha, 540, Bento Gonçalves, RS, Brasil, CEP 95700-206. E-mail: marco.fogaca@bento.ifrs.edu.br
3- Tecnólogo em Horticultura pelo IFRS – Campus Bento Gonçalves. E-mail: renato_lazzari@hotmail.com
4- Tecnólogo em Horticultura pelo IFRS – Campus Bento Gonçalves. E-mail: hluisdelima@gmail.com
5- Aluno do Curso de Tecnologia em Horticultura pelo IFRS – Campus Bento Gonçalves. E-mail: giovanidorigon200@gmail.com
6- Aluno do Curso de Tecnologia em Horticultura pelo IFRS – Campus Bento Gonçalves. E-mail: sandromorandi2009@hotmail.com

 

Resumo

 

O objetivo do trabalho foi avaliar o efeito da aplicação de Dormex® e Budbreaker® na quebra da dormência e produção da cultivar BRS Cora (Muscat Belly A x H. 65.9.14Vitis) cultivada em sistema de latada, na região  de Pinto Bandeira, Serra Gaúcha. Foi utilizado o delineamento inteiramente casualizado em um esquema com seis tratamentos, sendo eles: T1 – controle sem aplicação de indutor de brotação; T2, T3 e T4 – concentração de 1, 2 e 3% de Budbreaker®, respectivamente, e T5 e T6, concentração de 4 e 6% de Dormex® (cianamida hidrogenada), respectivamente; óleo mineral a 2% foi aplicado em todos os níveis de indutores de brotação. As variáveis respostas foram: produção por planta, massa de cacho e número de cachos; índice de brotação e fertilidade, como características físico químicas o teor de sólidos solúveis, considerando avaliação nas varas e esporões. Não houve resposta para a aplicação dos indutores de brotação, considerando as condições de elevada soma de horas de frio ocorridos no inverno de 2022,  que somando a baixa exigência de frio da cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.), beneficia o índice de brotação, tanto nas varas como nos esporões. A produção atingiu valores entre 41 e 54 toneladas/ha e o teor de sólidos variou de 15 a 16, considerado adequados para as características produtivas da variedade e as condições em que foram realizados o experimento.

Palavras-chave: Variedades americanas. Manejo. Brotação. Dormência.

 

 

Abstract

 

The objective of the work was to evaluate the effect of applying Dormex® and Budbreaker® on breaking dormancy and producing the cultivar BRS Cora (Muscat Belly A x H. 65.9.14Vitis) grown in a trellis system, in the region of Pinto Bandeira, Serra Gaúcha. A completely randomized design was used in a scheme with six treatments, as follows: T1 – control without application of sprouting inducer; T2, T3 and T4 – concentration of 1, 2 and 3% of Budbreaker®, respectively, and T5 and T6, concentration of 4 and 6% of Dormex® (hydrogenated cyanamide), respectively; 2% mineral oil was applied to all levels of sprouting inducers. The response variables were: production per plant, bunch mass and number of bunches; sprouting index and fertility, as well as physical and chemical characteristics, the content of soluble solids, considering evaluation in sticks and spurs. There was no response to the application of sprouting inducers, considering the conditions of high sum of cold hours that occurred in the winter of 2022, which together with the low cold requirement of the cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.), benefits the sprouting index , both in the sticks and spurs. Production reached values ​​between 41 and 54 tons/ha and the solids content varied from 15 to 16, considered adequate for the productive characteristics of the variety and the conditions under which the experiment was carried out.

Keywords: American varieties. Management. Budding. Dormancy.

 

 

Introdução

 

A Região Sul do Brasil, mais especificamente o Rio Grande do Sul, é o maior produtor de uva nacional, chegando a 50% do total da produção. A maior parte das uvas são destinadas para produção  de vinhos e sucos e uma pequena parcela destinada à uva de mesa para consumo in natura.  A região Sul por seu clima subtropical se destaca na produção de frutas de caroço e parreiras (ATLAS, 2022).

A Serra Gaúcha tem grande destaque na produção de uvas, na safra 2020/2021 ultrapassou 800 mil toneladas, comparado  a safra 2019/2020 que foram  colhidas 735 mil toneladas, obteve-se um acréscimo de 9% na produção, sendo 86% de variedades americanas e híbridas. Destacando-se a cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.), onde na safra 2021/2022 colheu-se 14.863.310,00 kg, com média de grau babo 15,4°, possuindo uma área total de vinhedos de 835,02  hectares. A BRS Cora (Vitis labrusca L.) possui um ciclo precoce em comparação com a variedade tradicional mais cultivada a  “Isabel” (EMBRAPA UVA E VINHO, 2004).

A cultivar BRS Cora (Muscat Belly A x H. 65.9.14Vitis) é oriunda do cruzamento entre “Muscat Belly A” x “BRS Rúbea” (CAMARGO; MAIA, 2004), lançada na Embrapa Uva e Vinho em 2004, possui uma alta coloração, sendo, usada para sucos próprios ou muitas vezes para dar cor a outra variedade, caso apresente uma deficiência na coloração. Normalmente a necessidade de frio destas Vitis labrusca L., variam entre 50 a 150  horas de frio (HF).

As uvas comuns representam mais de 80% da produção brasileira de uvas para processamento, e têm significativa importância também como uvas de mesa. Cerca de 40 cultivares entre Vitis labrusca, Vitis bourquina e híbridas interespecíficas compõem o elenco varietal brasileiro (RITSCHEL et al., 2011).

Na produção da videira são utilizadas várias práticas de manejo, tais como: adubação, tratamento fitossanitário, controle de plantas concorrentes, desbrota, desfolhas e dentre estas, se destaca a poda de inverno que é realizada quando a planta está  em estágio de dormência. Na Serra Gaúcha a poda inicia da metade para o final do inverno e consiste em limitar o número de gemas do ramo, para assim obter produtividade e vigor. A poda é um fator limitante, por ser uma atividade manual, que requer experiência por parte do podador, o que limita a contratação de mão de obra, que acaba sendo feita pelos próprios produtores. Em média nas pequenas propriedades da região, entre poda e amarração, são utilizados cerca de 50 dias de trabalho do viticultor.

Segundo Miele e Mandelli (2015), para as cultivares comuns e híbridas o sistema de condução mais utilizado é o sistema latada (Figura 1), com poda mista (varas e esporões). Os esporões que são ramos curtos de 1 a 3 gemas, são empregados tanto para frutificação como para produção de galho novo para a próxima poda. As varas são os ramos que variam de 5 a 9 gemas, têm como função principal a frutificação.

O clima do Rio Grande do Sul é muito variável, sendo que em invernos amenos, a quebra da dormência das gemas das videiras pode ser deficiente. As gemas dormentes dependem de um determinado número de horas de frio (HF) abaixo de 7,2 °C para sair da dormência e atingir bons níveis de brotação e consequentemente produtividade. Hoje, existem no mercado produtos que tem como objetivo compensar a falta de frio do período de dormência e compensar  as HF não acumuladas pelas plantas estimulando  assim o processo de brotação.

Ao longo do ciclo da parreira, o processo de crescimento, produtividade e qualidade são determinados por vários fatores como, a genética, solo, sistema de poda, condução, o clima e o manejo são os mais importantes. O Dormex® (cianamida hidrogenada) (BASF, 2022), atua sobre redução da atividade da enzima catalase, mas não alterando a atividade da enzima peroxidasse. Este complexo enzimático que atua na fisiologia das gemas da videira, impedindo ou atuando na saída da dormência das gemas para a próxima estação de crescimento (SHULMAN et al., 1985). É usado para estimular as auxinas provocando assim uma brotação com uniformidade e vigor, seu uso é recomendado em invernos menos frios e com a gema dormente, pois pode haver a queima da mesma. Atualmente o Dormex® é o produto mais comercializado, apesar de haver no mercado produtos similares.  Já o Budbreaker®, fertilizante foliar organomineral, é um produto líquido, formulado com base em aminoácidos específicos, composto de cálcio e ácidos orgânicos. Deve ser aplicado entre o período de gema dormente e gema inchada na cultura da maçã e videira, tendo os mesmos objetivos do Dormex®, ou seja, estimular brotação, obter floração maiores e mais homogêneas  (BIOGROW, 2021).

 

Figura 1 – Cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.) em sistema de condução latada submetida a poda mista com aplicação de Dormex® em concentração de 4%, início de brotação 29/09/2021. Pinto Bandeira/RS. Fonte: Autor (2021).

 

Os objetivos do trabalho foi avaliar o efeito da aplicação de Dormex® e Budbreaker® na quebra da dormência e produção da cultivar BRS Cora (Muscat Belly A x H. 65.9.14Vitis) cultivada em sistema de latada, submetida a poda mista na cidade de Pinto Bandeira, Serra Gaúcha.

 

Material e métodos

 

O experimento desenvolvido foi na safra de 2021/2022. A precipitação média anual foi de 101,4 mm, a umidade relativa média do ar foi de 74,6%, o número de horas de frio foi de 345 horas na safra 2021/2022 (EMBRAPA UVA E VINHO, 2021) e a temperatura média de 16,4 °C.

O experimento foi realizado na safra 2021/2022 em um vinhedo localizado no município de Pinto Bandeira/RS, Serra Gaúcha, de coordenadas geográficas 29°04’23.6″S e 51°26’30.2″E, a 640 metros de altitude, com “clima subtropical e pluviosidade média anual de 1696 mm e temperatura média de 18 °C” (EMBRAPA UVA E VINHO, 2021). Foi utilizada a cultivar Híbrida BRS Cora (Vitis labrusca L.), enxertada sobre o porta-enxerto Paulsen-1103 (Vitis berlandieri x Vitis rupestris), com 13 anos de idade. O espaçamento foi de 1,80 m entre plantas     e 2,50 a 3,00 metros entre filas, com densidade de 1.350 plantas/ha. As plantas foram conduzidas no sistema de latada, a poda seca foi realizada de forma manual com tesoura de poda, sistema de poda mista atingindo em média gemas/planta (varas e esporões), considerando entre 5 a 9 varas/planta, com média de 6 gemas por vara.

Foi utilizado o delineamento inteiramente casualizado em um esquema com seis tratamentos, sendo eles: T1 – controle sem aplicação de indutor de brotação; T2, T3 e T4 – concentração de 1, 2 e 3% de Budbreaker®, respectivamente, e T5 e T6 – concentração de 4 e 6% de Dormex® (cianamida hidrogenada), respectivamente. Em todas as concentrações de indutores de brotação foi aplicado óleo mineral a 2%. A aplicação dos produtos foi realizada com rolo de espuma de forma homogênea, utilizando-se em média 50ml/planta. A aplicação dos indutores de brotação, foi realizada no dia 01/09, pouco depois da poda seca, em estádio de gema dormente (V05), segundo a escala de Lorenz et al. (1995).

As variáveis analisadas para a produtividade foram: o índice de brotação (número de brotos/ número de gemas deixadas na poda), índice de fertilidade (número de cachos/número de brotos), número de cachos por planta (contados na colheita), produção por planta (número de cachos multiplicado por medida da massa dos frutos por planta, sendo que a massa aferida na colheita e pesado em balança eletrônica de precisão, sendo os resultados expressos em gramas), massa média de cacho (estima-se a massa média dos frutos a partir dos resultados de número de frutos e produção por planta, sendo os resultados expressos em grama), produção por hectare (estimada a partir dos resultados da produção por planta, multiplicado pelo número de plantas por hectare, sendo os resultados expressos em toneladas por hectare).

A colheita foi realizada na maturação tecnológica, no dia 1 de fevereiro de 2022. As uvas foram colhidas de forma manual com o auxílio de uma tesoura de poda e as bagas foram coletadas para análise de forma a se tentar homogeneizar o máximo possível das amostras, coletadas de todos os lados da planta e na zona basal, mediana e apical de diferentes cachos segundo metodologia descrita por Rizzon e Miele (2002). Em relação aos parâmetros de qualidade das bagas foram analisados: o teor de sólidos solúveis totais (ºBrix), determinado a partir de uma amostra de aproximadamente 30 bagas coletadas por planta, no momento da colheita, utilizando-se um refratômetro manual com auto compensação de temperatura, conforme proposto por Carvalho et al. (1990).

Exceto a aplicação dos indutores de brotação, todas as demais práticas de manejo foram realizadas da mesma maneira e na mesma época em ambos os tratamentos. Foram utilizadas 5 repetições por tratamento, sendo um total de 30 plantas a serem avaliadas, considerando uma planta como unidade experimental. Os dados foram submetidos à análise de variância, e as médias comparadas pelo teste Tukey, à 5% de significância.

 

Resultados e discussão

 

A análise estatística dos resultados demonstrou que não houve interação/efeito para aplicação das doses e tipos de produtos empregados (Dormex® e Budbreaker®), na quebra da dormência da gemas da cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.), para as variáveis produtivas e teor de sólidos solúveis. As diferenças encontradas, se relacionaram com os elementos de poda, esporão e vara, que foram individualmente analisados (Tabela 1 e 2).

A indução da brotação por reguladores de crescimento é uma prática de manejo comum para algumas cultivares de videira, auxiliando na quebra da dormência das gemas da videira, como descrito em pesquisas por vários autores (LAMELA et al., 2016; FOGAÇA et al., 2021; FOGAÇA, 2022). No entanto, a resposta das plantas ao Dormex®, está mais embasada pela pesquisa, enquanto o Budbreaker®, embora com a mesma função, ainda  é pouco utilizado na cultura da videira. No entanto,  a maneira de estimular as reações que se processam na entro da planta para iniciar o novo ciclo tem a mesma origem, e vão ser afetados em maior ou menor grau pelo tipo de poda, vigor da planta, época de aplicação, condições climáticas no momento da aplicação, volume de calda e doses aplicadas entrem outros fatores.

 

Tabela 1 – Aspectos vegeto-produtivos da cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.) submetidos a quebra da dormência. Tratamentos: T1 – testemunha; 3 doses de Budbreaker®: T2, T3 e T4 – concentração de 1, 2 e 3% e 2 doses de Dormex® (cianamida hidrogenada): T5 e T6 na concentração de 4 e 6%. Pinto Bandeira/RS, 2022.
Variáveis analisadas
T1
T2
T3
T4
T5
T6
CV%*
Número de gemas por planta
191ns
184
181,5
186
192,5
187
17,85
Número de gemas nos esporões
128,5ns
122
129,5
124,5
140,75
140,75
25,34
Número de gemas nas varas
62,5ns
59,5
54,5
61,5
51,75
46,25
22,39
Número de varas por planta
7,5ª
7ab
7ab
7,5a
7ab
5,25b
16,08
Massa de cacho por planta (kg)
37,78ns
33,1
31,5125
39,51
29,73
41,83
24,56
Massa de cacho nos esporões (kg)
19,47ns
18,53
14,64
21,37
13,47
21,33
13,7
Massa de cacho nas varas (kg)
18,31ns
14,57
16,87
18,14
16,26
16,26
20,49
Massa média dos cachos (g)
109,13ns
114,53
138,36
137,04
118,07
129,9
8,92
Número de brotos por planta
49,25ab
46,75ab
41,5ab
52,75a
44,5ab
35,25b
16,9
Número de brotos nos esporões
121ns
114,25
115,5
120,5
94,25
129,75
25,52
Número de cachos nos esporões
224ª
205aA
168,5aB
119aA
117,5aB
179,5aA
42,99
Número de cachos nas varas
146,25aB
118,5aB
113,75aB
130,2aB
116aB
127aB
24,31
Número de cachos por planta
370,25ns
293
270,75
363,5
233,5
328
36,24
Índice de brotação por planta
1,14ns
0,85
0,84
0,98
0,81
0,7
19,69
Índice de brotação varas
1,2ns
1,14
1,45
1,16
1,18
1,36
31,94
Índice de brotação esporão
1,37ns
1,08
1,175
0,98
1,37
1,28
35,14
índice de fertilidade planta
1,9ns
1,82
1,52
1,74
1,58
2,18
24,39
Índice de fertilidade esporão
1,74aB
1,56aB
1,62a
1,52aB
1,41aB
1,23aB
28,35
Índice de fertilidade vara
3,06aA
2,57aA
2,84aA
2,47aA
2,82aA
3,63aA
30,32
Produção por ha (t)
52,14ns
45,68
43,48
54,52
41,04
57,73
24,56
Teor de sólidos solúveis
15ns
15,75
15,25
15,06
15
16
4,71
*CV %: Coeficiente de Variação. **Médias seguidas de mesma letra minúscula na linha e maiúscula na coluna, não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey, com 5% de significância.

 

Considerando o fator frio invernal, no ano de 2021 ocorreram 325 HF entre abril e setembro (EMBRAPA UVA E VINHO, 2021), valores suficientes para quebra e indução da brotação das gemas da cultivar híbrida BRS Cora (Vitis labrusca L.). Estes dados somados aos resultados obtidos para índice de brotação (IB), indicam que em anos com previsão meteorológica de frio superior a ou igual a necessidade da cultura (HF) em superar a dormência, não há necessidade de aplicar indutor de brotação em variedades com baixa necessidade de (HF), como no caso da cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.) que é de 50 a 150 HF.

Analisando os elementos de poda e o índice de brotação (IB), não diferem entre as gemas das varas e dos esporões, variando entre 0,98 e 1,14 (Tabela 1). Estes dados diferem de muitos autores, pois, citam que devido o efeito da dominância apical, a brotação  das gemas das varas é inferior aos esporões (DAL MAGRO; FOGAÇA, 2015; MAUTONE, 2018). Considerando o índice de fertilidade (IF), as varas apresentaram valores médios que variaram de 2,6 a 3,63, significativamente superior aos 1,23 a 1,70, obtidos para esporões (Tabela 1), resultado que concorda com Mautone (2018) e Fogaça et al. (2020). Segundo Leão e Maia (1998), esse IF superior nas varas é devido a maior exposição das gemas das varas à luz solar diretamente incidente, que é um dos principais fatores climáticos que atuam sobre o aumento da diferenciação floral, ocorrendo uma maior alocação de carboidratos nessas gemas em detrimento das gemas da base dos ramos que formam os esporões.

Estes resultados indicam que o tipo de poda da BRS Cora (Vitis labrusca L.), pode ser realizada  na forma de poda mista, como a poda longa, tanto pela fertilidade das gemas, quanto pela facilidade de produção de madeira para o ciclo seguinte, pois as varas apresentaram o mesmo IB dos esporões, elemento de poda que em muitas variedades de videira, apresenta como principal função a emissão de ramos para as safras seguintes, como as variedades Itália, Rubi, Nebbiolo, entre outras.

A produção estimada por ha, variou de 41,04 t a 57,73 t, produção elevada considerando as baixas precipitações que ocorreram no ciclo 2021 (EMBRAPA UVA E VINHO, 2021), embora o potencial produtivo da variedade chegue a 70,4 t/ha (EMBRAPA UVA E VINHO, 2004).

A massa média de cacho por planta variou de 29,71 a 37,8 kg/planta, enquanto a massa média dos cachos atingiu entre 109,1 e 138,4 g,  valores que não diferiram entre os tratamentos.

A análise diferenciada entre a produção, poda, varas e esporões, não se correlacionou, com o número de gemas deixadas na poda. A carga de gemas dos esporões foi o dobro das gemas das varas, no entanto, a produção nesses elementos de poda não diferiu entre si, variando em média de 16 a 19 kg na vara e esporão. Os dados mostraram que a fertilidade elevada das varas foi superior à dos esporões, compensou essa diferença nas gemas, considerando que não houve diferença entre o IB entre os elementos de poda (Tabela 1).

Com relação ao teor de sólidos solúveis totais (SST), o valor médio entre os tratamentos foi de 15,34 °Brix (Tabela 2), valor acima dos 14 °Brix mínimos, exigidos para produção de uvas para suco e vinho no Brasil, segundo a Instrução Normativa n° 14, de 8 de fevereiro de 2018 (BRASIL, 2018). Considerando que a safra de 2022 ocorreu sobre uma condição de clima seco, a maturação ocorreu sob condição de baixa umidade e elevada insolação, fatores afetam o metabolismo da videira atuando diretamente no metabolismo dos açúcares e aumento dos SST (KELLER, 2010).

 

Tabela 2 – Produção por hectare e sólido solúveis totais (ºBrix) da cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.), submetidos a quebra da dormência. Tratamentos: T1 – testemunha, 3 doses de Budbreaker®: T2, T3 e T4 – concentração de 1, 2 e 3% e 2 doses de Dormex® (cianamida hidrogenada): T5 e T6 na concentração de 4 e 6%. Pinto Bandeira/RS, 2022.
Variáveis analisadas
T1
T2
T3
T4
T5
T6
CV%*
Produção por ha (t)
52,1ns
45,68
43,48
54,52
41,04
57,73
24,56
Teor de sólidos solúveis
15ns
15,75
15,25
15,06
15
16
4,71
*CV %: coeficiente de variação. **Médias seguidas de mesma letra na linha não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey, com 5% de probabilidade de erro.

 

Pesquisando as características físico químicas da uva BRS Cora (Vitis labrusca L.), Kaltbach et al. (2022), obteve valores de 14,1 e 15,5 para o teor de sólidos solúveis, nas safras de 2018 e 2019, respectivamente, valores que concordam com os dados obtidos no experimento. Segundo esse autor a variedade apresenta como característica não alterar as suas características físico-químicas com as variações climáticas. A precipitação reduzida  na maturação, em comparação a média regional, beneficiou  os bons valores do grau °Brix, mesmo com altos índices de produção, o que demonstra a grande adaptabilidade da cultivar BRS Cora as condições climáticas da Serra Gaúcha.

 

Conclusão

 

A aplicação dos indutores de brotação Budbreaker® e Dormex®, independente da dose aplicada, não diferiram da testemunha, tanto para os elementos de poda, vara e esporão, nas condições que foram realizadas o experimento, que ocorreu em um inverno de alto número de horas de frio.

O índice de fertilidade nas varas foi superior aos esporões, indicando ser uma cultivar  que se adapta a poda mista e longa.

Considerando a cultivar BRS Cora (Vitis labrusca L.), em anos com previsão meteorológica de frio superior ou igual a necessidade da cultura em horas de frio, não se recomendaria a utilização de indutores de brotação.

 

Conflito de Interesses

 

Não houve conflito de interesses entre os autores.

 

Contribuição dos autores

 

Milena Parizzoto Lerin e Marco Aurélio de Freitas Fogaça – proposta do projeto, instalação do experimento, escrita e interpretação dos dados, revisão do manuscrito; Renato Lazzari, Luiz Henrique de Lima, Giovani Dorigon e Sandro Morandi – ajudaram na instalação, manejo de plantas e coleta dos dados.

 

Referências bibliográficas

 

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BASF. Basf Company. Dormex®. Bula e Informações do Regulador de Crescimento Vigoroso de Frutas. 2022. https://agriculture.basf.com/br/pt/protecao-de-cultivos-e-sementes/produtos/dormex.html

BIOGROW. Biogrow Company. Budbreaker®. Diminua a dominância apical com Budbreaker. 2021. https://biogrow.com.br/category/budbreaker/

BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa nº 14, de 8 de fevereiro de 2018. Complementação dos Padrões de Identidade e Qualidade do Vinho e Derivados da Uva e do Vinho, na forma desta Instrução e do seu Anexo. Brasília, DF, 2018. https://sistemasweb.agricultura.gov.br/conjurnormas/index.php/INSTRUCAO_NORMATIVA_N_14_DE_8_DE_FEVEREIRO_DE_2018

CAMARGO, U. A.; MAIA, J. D. G. BRS Cora – Nova Cultivar de Uva para Suco, adaptada a Climas Tropicais. Bento Gonçalves: Embrapa Uva e Vinho, Comunicado Técnico 53, 2004, 4p. https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/handle/doc/539513

CARVALHO, C. R. L.; MANTOVANI, D. M. B.; CARVALHO, P. R. N.; MORAES, R. M. Análises químicas de alimentos: manual técnico. Campinas: Instituto de Tecnologia de Alimentos, 1990, 121p.

DAL MAGRO, L.; FOGAÇA, M. A. F. Efeito dos diferentes tipos de poda seca na produção e na qualidade da uva Cabernet Sauvignon. Revista Brasileira de Viticultura e Enologia, n. 7, p. 28-34, 2015. https://www.enologia.org.br/default/uploads/revista/revista-29.pdf?d312a75327476bda651d52efe6647e94

EMBRAPA UVA E VINHO. Agrometeorologia Bento Gonçalves – RS. 2021. https://www.embrapa.br/uva-e-vinho/dados-meteorologicos/bento-goncalves

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Recebido em 6 de agosto de 2023

Retornado para ajustes em 28 de setembro de 2023

Recebido com ajustes em 1 de outubro de 2023

Aceito em 2 de outubro de 2023